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PRAGAS VEGETAIS E OUTRAS CALAMIDADES
O sufixo “-cida” significa etimologicamente “que mata”, “anti-vida”. Assim, os pesticidas matam as pragas vegetais, os insecticidas matam os insectos, os fungicidas matam os fungos e os bolores, os herbicidas matam as ervas espontâneas, etc. As nossas batalhas contra estas formas de vida tidas como indesejáveis provocam importantes danos colaterais. Lutando obstinadamente contra os organismos vivos que comprometem as nossas exigências de rendimento, nós ignoramos as regras fundamentais da Vida. A guerra química que levamos a cabo nos campos fará de nós grandes perdedores.
Há mais seres vivos num só metro cúbico de terra fértil do que seres humanos no planeta inteiro. Bactérias, leveduras, fungos, vermes, insectos… tantos organismos implicados na vida do solo e a regeneração do seu húmus. Voltando ao solo depois da pulverização, os –cidas matam estas formas de vida. A terra torna-se mineral e estéril. E os adubos químicos tornam-se então indispensáveis às culturas.
As bactérias e os organismos monocelulares são as primeiras formas de vida aparecidas na terra. Tudo partiu daí e tudo aí regressa. Todos os ciclos do Ser Vivo, seja vegetal, animal ou humano, passam por estas vidas microscópicas para se regenerar e engendrar novas vidas, particularmente através dos ciclos de compostagem. São estas vidas do infinitamente pequeno que nós destruímos na nossa guerra cega. Com os nossos massacres químicos, comprometemos os fundamentos do ciclo de vida de que fazemos parte.
Esta guerra química tem uma outra consequência inquietante. Como todas as formas de vida terrestre, as espécies que nós exterminamos lutam incansavelmente para assegurar a sobrevivência da sua espécie.
Em qualquer tentativa de exterminação, há sempre sobreviventes. E quando os sobreviventes regressam, já se adaptaram aos riscos precedentes.
Todos os organismos vivos têm a capacidade de sofrer mutações, e de evoluir para se adaptarem ao ambiente. Por isso não é por acaso que as pragas vegetais são cada vez mais resistentes e virulentas. Do mesmo modo, as ervas ditas “daninhas” e os insectos “nocivos” sofrem mutações regularmente, para se adaptarem e resistirem melhor às nossas armas químicas. Em 1938, 7 insectos parasitas resistiam aos insecticidas; em 1954 eram já 23; em 1982, 432… Hoje são já 900 os organismos que oferecem resistência aos produtos químicos. E provocam a destruição de 35 a 40% das colheitas através do planeta.
Ao mesmo tempo não têm cessado de aumentar as quantidades de produtos químicos, a sua complexidade e o seu uso associado. Em França todos os anos são utilizadas 100 mil toneladas de pesticidas, no valor de 2 biliões de Euros. No mundo inteiro são utilizadas por ano 500 mil toneladas de matérias activas, quantidade que triplicou nos últimos 15 anos.
Confrontadas com um ambiente cada vez mais nocivo, as plantas cultivadas são cada vez mais frágeis. As pragas são cada vez mais resistentes e violentas. Cada batalha que nós cremos ganhar na luta contra a natureza, traz consigo o princípio da nossa próxima derrota. Lutando obstinadamente contra os organismos vivos que comprometem as nossas exigências de rendimento, acabamos a lutar contra as regras fundamentais da vida. Seremos, sem qualquer dúvida, os grandes perdedores desta guerra química. Uma guerra que já transformou as nossas terras em campos de batalha, e o conteúdo dos nossos pratos em fonte de inquietações.
O monopólio imposto pelas empresas de sementes reduziu igualmente a diversidade de culturas à escala mundial. As culturas de híbridos patenteados tornaram-se norma. Há 50 anos, a colheita mundial de trigo repartia-se por dezenas de variedades. Hoje mais de 80% da colheita depende apenas de três variedades, três híbridos patenteados e comercializados pelas multinacionais da agro-química, que são também sementeiras.
Os híbridos são plantas saídas de numerosos cruzamentos sucessivos. E oferecem muitas vezes elevadas características de produtividade e rendimento por hectare. Mas são plantas frágeis, e o fenómeno atinge todas as culturas. Há 50 anos, cultivavam-se na Índia cerca de um milhar de variedades de arroz. Hoje restam poucas dezenas. Os híbridos patenteados vão conquistando os campos dos últimos camponeses recalcitrantes.
Por causa desta fraca diversidade, e da fragilidade das variedades cultivadas, o aparecimento de novas pragas resistentes à química e particularmente virulentas poderá atingir brutalmente uma parte significativa das colheitas mundiais. Ao contrário do que querem fazer-nos crer as multinacionais da agroquímica, que hoje pretendem fazer-nos engolir os OGM (organismos geneticamente manipulados), os nossos métodos de cultura industriais e químicos estão longe de nos garantir soberania alimentar. Bem ao contrário, fazem-nos viver sob a ameaça de fomes mundiais sem precedentes.
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