terça-feira, 24 de agosto de 2010

Planeta-Mãe - 23

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A especulação bolsista
Ela antecipa, acelera e amplifica as tendências económicas que se perfilam. Se a ameaça de penúria alimentar se manifestar num contexto de crise económica, a especulação sobre os produtos agrícolas pode atingir a desmesura.
O que é que procuram os investidores? Um suporte seguro e rentável onde possam colocar o seu dinheiro. E qual é o seu objectivo? Fazer frutificar o capital, quer dizer, ganhar dinheiro com o seu dinheiro. Como fazer? Comprar, por exemplo, acções duma companhia que lhes traga dividendos. Sendo muito procuradas as acções de sociedades rentáveis e generosas em dividendos, o seu valor em bolsa aumenta. Este aumento de valor permite então criar mais-valias, em caso de revenda das acções. “Comprar em baixa e revender em alta” é a palavra de ordem.
Quando as perspectivas de rentabilidade das empresas se tornam sombrias, os investidores voltam-se para outros suportes de investimento, que não as acções. “O que é que posso comprar hoje no mercado, cujo valor tenha fortes possibilidades de aumentar amanhã?” A resposta é: aquilo que corre o risco de se tornar raro. É sabido que tudo o que é raro – e procurado - é caro.
O ouro, cujo valor está ligado à raridade do metal, é muitas vezes um refúgio. O seu valor aumenta significativamente em períodos de crise económica e financeira.
Ameaçados de escassez, os produtos agrícolas poderiam transformar-se em valor- refúgio. Os bens alimentares de base são hoje cotados em bolsa, num mercado mundializado. Os preços do trigo, do arroz, do milho, da soja, do açúcar… flutuam ao sabor da oferta e da procura. Quando a oferta baixa e a procura aumenta, os preços sobem.
Num contexto económico e financeiro em que todos os “papéis” se afundem, a especulação no mercado dos produtos agrícolas pode tomar proporções surrealistas. Tanto mais que estes produtos oferecem uma garantia infalível: mesmo no fundo duma crise económica, os seres humanos não deixam de comer.
Esta especulação permitiria uma vez mais a alguns afortunados registar substanciais mais-valias, sendo a consequência do seu enriquecimento a fome dos mais pobres e desprotegidos. E seria surpreendente que eles tivessem escrúpulos, porque os escrúpulos nunca foram um freio para o funcionamento do sistema capitalista.
Excluindo algumas excepções, como as indústrias de guerra, a redução da actividade económica segue a par com a redução dos efectivos nas empresas. O desemprego é o sintoma social duma escassez de trabalho. Os desempregados não só perdem o salário, mas também o moral. Os que temem a mesma sorte perdem a confiança e duvidam do futuro. Em tal estado de espírito, o momento não é de endividamento e consumo, mas de desendividamento e poupança. Isso abranda ainda mais o consumo, acentuando a recessão. E a crise social torna-se uma causa da crise económica.
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