(...)
No fim da manhã o ar aqueceu, e farrapos de névoa erguiam-se da água. O céu manteve a claridade azul, mas por vezes o mar ocultava-se atrás dum véu vaporoso. O bando aproximava-se do ponto onde se encontram a corrente fria do Lavrador, deslocando-se para sul, e a corrente quente do Golfo, dirigindo-se para norte. Aqui, ao largo da Terra Nova, a corrente do Golfo é desviada para leste, para o Atlântico Central. Durante uma hora foram atravessando bancos de nevoeiro, até que a vista do mar ficou livre. O verde pálido da água deu lugar ao azul marinho, e as duas cores delimitavam-se tão rigorosamente como o mar e a praia. As aves encontravam-se sobre a corrente do Golfo, que vem dos trópicos. O verde da corrente do Lavrador, último prolongamento do Árctico, desvanecia-se atrás delas.
As suas asas batiam mecanicamente, sempre com idêntico andamento, nunca fatigadas. O ar era cada vez mais quente, pois em cada hora avançavam 80 quilómetros para sul. E na monotonia do seu voo só alguma coisa mudava quando, perdendo altitude, planavam cerca de uma hora até à flor das ondas. Depois subiam outra vez.
Visto de perto, descobria-se que o mar, tal como a tundra, só aparentemente era deserto e sem vida. As aves passavam ao rés da água, que formigava de vida. Por vezes cintilavam as medusas, ao longo de quilómetros, como discos brilhantes. Cardumes de pequenos peixes vinham à superfície, e o sol reflectia-se, metálico, em milhares de corpos prateados. Depois apareciam autênticas nuvens de plâncton, organismos unicelulares microscópicos, cada um deles um minúsculo ponto colorido e invisível. Mas eram aos biliões, e coloriam quilómetros de mar de um vermelho vivo.
À superfície da água havia também outras aves, que passavam a maior parte da via a cardar no mar alto. Apenas voavam para terra quando o impulso de acasalamento as chamava. Paínhos-mergulhadores, de patas coloridas, esvoaçavam por ali como borboletas, e precipitavam-se entre as ondas. Os seus vultos faiscavam como reflexos minúsculos, e sem descanso procuravam alimento, pequenos crustáceos e plâncton. Aves aquáticas que tinham nidificado na tundra, no meio das narcejas suas parentes, tinham regressado ao mar, em cuja solidão se manteriam até à próxima época de criação. Casualmente passava um grande albatroz, com as suas braçadas escuras e tranquilas, que aproveitavam habilmente a impulsão criada sobre as cristas das ondas, pelos movimentos da água. Mas aqui tratava-se de verdadeiras aves marinhas. O mar alimentava-as e concedia-lhes repouso quando as asas se lhes fatigavam, pois podiam nadar tão perfeitamente como voavam.
O maçaricão e as tarambolas, porém, só podiam voar, voar e voar, adiando o descanso e o alimento, até atingirem terra firme.
Quando a noite chegou tinham atravessado o braço da corrente do Golfo que se dirige para leste. Encontravam-se agora no meio do Atlântico, numa zona de cinco milhões de quilómetros quadrados, onde nenhuma corrente agita a água salobra, e onde boiam ilhas de algas esponjosas. Estavam sobre o mar dos Sargaços, o mais estranho de todos os mares. E voavam há quase vinte e quatro horas sem descanso.
(...)
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário