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Voavam silenciosos, para não desperdiçarem respiração nem energias. Esta travessia do oceano demorava apenas metade da esgotante viagem sobre o Atlântico. Mas no outono, graças às bagas do Lavrador, as aves partiam gordas e bem alimentadas. Agora iniciavam o trajecto sobre o Pacífico já esgotadas e emagrecidas. Duas horas mais tarde teriam os papos vazios.
Quatro horas depois tinham ultrapassado a zona dos alísios de sueste, e alcançaram as calmarias equatoriais. Mas o mar por baixo deles estava tudo menos calmo. Baloiçava fortemente em pequenas rebentações que provocavam carneiros de espuma, um verdadeiro campo de batalha. Aqui encontram-se a corrente fria de Humboldt e a corrente quente do Equador, e ambas lutam pelo domínio do mar. Embora só com a luz do luar, as aves podiam observar como a cor do oceano mudava subitamente. O verde glacial da corrente de Humboldt cedeu lugar ao azul profundo das águas tropicais. E o ar aqueceu.
A lua desapareceu e começou a amanhecer. Pouco depois do romper do dia atingiram a zona dos alísios de nordeste, e estes ventos de lado aligeiraram o voo. Mas o dia estava quente. O ar húmido e abafado anulava o efeito agradável do vento.
Voaram hora após hora com velocidade estável, mantendo constante o ritmo esgotante e monótono de três a quatro batidas por segundo. O cintilar do sol sobre a água foi enfraquecendo, e desapareceu completamente ao atingir o zénite. O mar tornou-se mais azul. Então o sol descaiu para oeste e a cintilação voltou. Oitocentos metros abaixo deles brilhavam as cristas das ondas, e o ar aqueceu ainda mais. Desde que a costa da América do Sul desaparecera na escuridão da última noite, nada alterara a monotonia e a desolação do mar, a não ser, aqui e acolá, um albatroz, que planava com as suas asas poderosas e imóveis. Os maçaricões voavam infalivelmente para norte, sem se desviarem do rumo. Os seus cérebros estavam mais bem compensados, em relação às forças de orientação da terra, do que a bússola mais sensível.
O macho, que seguia na frente e tinha que vencer maior resistência do ar do que a fêmea, sofria de particular cansaço. As tormentosas pontadas que lhe arrepanhavam os músculos do peito tornaram-se numa dor surda e constante. O coração batia fortemente. Poderia descansar um pouco, se cedesse o comando à fêmea. Mas o facto de ela se manter atrás dele, e beneficiar da força com que ele atacava o ar, o facto de o voo dela depender do seu, comovia-o como um sentimento quente e sublime, que o fez aguentar. Inabalável, manteve o comando.
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quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
Planeta-Mãe - 29
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CAMPOS DE BATALHA DESLOCALIZADOS
Numerosos produtos fito-sanitários (um nome politicamente correcto) foram reconhecidos como perigosos para a saúde humana. Alguns foram proibidos… em certos países. Só em certos países!
As nossa culturas mais poluentes e mais perigosas para a saúde foram progressivamente deslocalizadas para países mais permissivos. Além das doenças que favorecem, os produtos agro-tóxicos provocam a morte de mais de 30 mil pessoas por ano no mundo. As populações mais afectadas são as dos países mais pobres, não protegidos por normas sanitárias e ambientais. E no fim da cadeia alimentar nós encontramos estes produtos no prato através do cacau, o café, as bananas, o ananás, a carne, etc. O DDT, por exemplo, proibido há mais de 30 anos, foi encontrado no sangue dos nossos ministros europeus do ambiente. O DDT continua a ser utilizado em numerosos países pobres, que produzem o que nós comemos. Perante a sua proibição, certas multinacionais deslocalizaram a produção de substâncias proibidas nesses mesmos países, contentando-se com a mudança da designação comercial. Desprotegidos pelos seus governos, mantidos na ignorância pelas empresas que procuram os seus lucros, a maior parte dos camponeses pobres nem imaginam aquilo com que estão confrontados.
Depois da eleição de G.W.Bush, a empresa Monsanto fez votar uma lei autorizando a exportação para outros países de produtos proibidos em território americano. Esta autorização inclui produtos que revelaram “comprovada perigosidade para a saúde humana”. Monsanto participou activamente no financiamento da campanha de Bush e tinha no seu conselho de administração membros do governo americano.
Syngenta, um concorrente suíço da Monsanto, fabrica e comercializa há anos um produto altamente tóxico chamado Paraquat. Nunca foi autorizado em território suíço, pela sua comprovada perigosidade para a saúde humana. Foi proibido em numerosos países mas aceite noutros, como em França, contra a opinião das autoridades sanitárias da época. Porque a sua eficácia contra certas doenças da vinha e da fruta podia constituir uma vantagem concorrencial para os produtores. Inversamente, privar-se dele era correr o risco de ser menos produtivo.
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CAMPOS DE BATALHA DESLOCALIZADOS
Numerosos produtos fito-sanitários (um nome politicamente correcto) foram reconhecidos como perigosos para a saúde humana. Alguns foram proibidos… em certos países. Só em certos países!
As nossa culturas mais poluentes e mais perigosas para a saúde foram progressivamente deslocalizadas para países mais permissivos. Além das doenças que favorecem, os produtos agro-tóxicos provocam a morte de mais de 30 mil pessoas por ano no mundo. As populações mais afectadas são as dos países mais pobres, não protegidos por normas sanitárias e ambientais. E no fim da cadeia alimentar nós encontramos estes produtos no prato através do cacau, o café, as bananas, o ananás, a carne, etc. O DDT, por exemplo, proibido há mais de 30 anos, foi encontrado no sangue dos nossos ministros europeus do ambiente. O DDT continua a ser utilizado em numerosos países pobres, que produzem o que nós comemos. Perante a sua proibição, certas multinacionais deslocalizaram a produção de substâncias proibidas nesses mesmos países, contentando-se com a mudança da designação comercial. Desprotegidos pelos seus governos, mantidos na ignorância pelas empresas que procuram os seus lucros, a maior parte dos camponeses pobres nem imaginam aquilo com que estão confrontados.
Depois da eleição de G.W.Bush, a empresa Monsanto fez votar uma lei autorizando a exportação para outros países de produtos proibidos em território americano. Esta autorização inclui produtos que revelaram “comprovada perigosidade para a saúde humana”. Monsanto participou activamente no financiamento da campanha de Bush e tinha no seu conselho de administração membros do governo americano.
Syngenta, um concorrente suíço da Monsanto, fabrica e comercializa há anos um produto altamente tóxico chamado Paraquat. Nunca foi autorizado em território suíço, pela sua comprovada perigosidade para a saúde humana. Foi proibido em numerosos países mas aceite noutros, como em França, contra a opinião das autoridades sanitárias da época. Porque a sua eficácia contra certas doenças da vinha e da fruta podia constituir uma vantagem concorrencial para os produtores. Inversamente, privar-se dele era correr o risco de ser menos produtivo.
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quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
Hora do folhetim - 39
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9
Ano após ano, durante os nove meses de migração, os maçaricões eram como peões num gigantesco tabuleiro de xadrez. As suas rotas eram definidas por jogos cósmicos, pelas forças da natureza e da geografia, pelos ventos, pelas marés e pelo estado do tempo. Os ventos determinavam em que direcção as aves deviam voar. O tempo e as chuvas decidiam se havia mais ou menos alimento, definindo desse modo o objectivo do voo. Na partida de xadrez intervinha agora um outro jogador, uma corrente marítima.
A corrente de Humboldt vem do Antárctico, corre ao longo da costa oeste da América do Sul, em direcção ao norte, e transporta águas frias quase até ao equador. Os ventos que varrem todas as tardes a costa do Peru são secos, pois a água fria da corrente de Humboldt quase não sofre evaporação. Assim, a estreita faixa de costa entre os Andes e o Pacífico é árida, com planaltos arenosos quase desertos e pouca precipitação. Há muito poucos rios que corram para o Pacífico e formem estuários pantanosos, onde as marés depositem alimento para as narcejas. Por isso neste local os maçaricões pouco encontram que comer. Depois da travessia dos Andes estão magros e esgotados, mas a região não convida a demoras. Assim, continuaram a voar, sem grande descanso.
Seguiram as estreitas praias do Peru na direcção do norte. Voavam, noite após noite, até à madrugada, e aproveitavam cada hora do dia para se alimentarem. Tarefa difícil esta, pois estavam sempre esgotados e nunca completamente fartos. Para os jogos amorosos não restavam tempo nem energias, pois estes mal chegavam para descansar.
Em menos de uma semana tinham percorrido 3200 quilómetros, atingindo a planície arenosa de Punta Pariña, perto do equador. A partir daqui, ao longo de 1600 quilómetros, a costa sul americana segue na direcção nordeste, até ao istmo do Panamá.
Aproximava-se o mês de Março. Lá em cima, no norte, começava a primavera no vale do Mississipi, tornando verdes os choupos e as pradarias. Os maçaricões encontravam-se ainda a sul do equador, a tundra estava a quase dez mil quilómetros de distância. Mas ela chamava-os já tão fortemente, que os seus músculos cansados e doridos não eram suficientemente rápidos.
Até às exuberantes terras altas da Guatemala descrevia a costa um grande arco, que primeiro corria para leste, depois para norte e finalmente para oeste. A etapa era de quatro mil quilómetros. Em linha recta a distância era cerca de metade, mas passava sobre o Pacífico. Quando a noite que caía arrefeceu a areia quente, o maçaricão ainda tinha fome, o papo não estava cheio. Mas levantou voo, no crepúsculo tropical, e a fêmea seguiu-o. Tomaram a direcção do norte, abandonaram a faixa plana da costa e dirigiram-se para o mar alto. Deviam atingir a América Central vinte e quatro horas depois.
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Planeta-Mãe - 28
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A REVOLUÇÃO VERDE
Só uma estratégia permitia vencer estes dois desafios duma só vez: para aumentar os rendimentos agrícolas, forçando os camponeses a deixar as suas terras, bastou fazer a própria agricultura entrar na era industrial. O emparcelamento foi feito neste sentido, favorecendo as grandes áreas dum só terratenente, em prejuízo das pequenas parcelas. As grandes explorações foram privilegiadas, tendo sido subvencionadas para se mecanizarem. Algumas taxas, até então indexadas à área cultivada, tornaram-se acidentais. Proporcionalmente, os encargos das grandes explorações foram aligeirados, e as dos mais pequenos aumentaram. As produções aduzidas pela mecanização e a química fizeram baixar o preço dos produtos alimentares, arrastando os rendimentos dos pequenos camponeses. Foi assim que a pobreza dos pequenos camponeses se acentuou, durante o que chamámos a revolução verde.
Pais trabalhando de sol a sol, seis dias por semana, filhos nos campos após a escola e durante as férias, os fins do mês a pão e leite… são uma outra realidade vivida por milhões de jovens franceses nos anos 50 e 60. Os “happy days”, a “trintena gloriosa”, a “febre de sábado” não foram para toda a gente. Os cursos de jardinagem foram suprimidos dos programas escolares, a publicidade e as tentações do mundo moderno multiplicaram-se… e aconteceu o êxodo rural que fora programado. Os relatórios remetidos ao gen. De Gaulle em 1950 não estavam errados: diziam eles que, criando uma significativa diferença de nível de vida entre o campo e as cidades, o êxodo das populações rurais para as luzes das cidades far-se-ia “naturalmente”.
O desenvolvimento do modo de vida urbano gerou novas necessidades: electrodomésticos, viaturas, mobiliário, passatempos, vestuário na moda… a sociedade de consumo estava em marcha. A maior parte destes bens de consumo era então produzida localmente. A sua fabricação acentuou a necessidade de mão-de-obra nas minas e nas fábricas.
A migração para a cidade gerou igualmente necessidades de alojamento. A construção de casas exigiu mais mão-de-obra. A nossa economia foi então tomada por uma fuga em frente, que hoje pode parecer surrealista: uma fuga em frente da parte do trabalho, responsável pela penúria de mão-de-obra.
Produzir mais com menos braços, tal foi a divisa do mundo industrial, assim como do mundo agrícola. Além das medidas fiscais, das subvenções e do emparcelamento, a ciência e as tecnologias foram postas ao serviço desta exigência.
Na agricultura, foram seleccionadas e melhoradas por hibridação as variedades cultivadas. Estes híbridos deviam oferecer:
- alto rendimento por hectare; crescimento rápido, em volume e em número; plantas adaptadas ao cultivo mecanizado; produtos fáceis de transportar, armazenar e conservar; variedades mais fáceis de cultivar e colher; legumes maiores e com melhor aspecto, etc.
Por exemplo, o trigo hoje cultivado cresce mais depressa e é menos alto do que as antigas variedades rústicas. Isso impede que as plantas se dobrem para o solo antes da ceifa, permitindo acelerar a rotação das culturas.
O cultivo de plantas híbridas tornou-se a norma. As sementes híbridas são protegidas por patentes, e não reproduzem as suas características de geração em geração. Assim, os agricultores têm que comprar novas sementes todos os anos. Perdem assim uma sabedoria fundamental: a produção das próprias sementes. Os sementeiros ganharam um poder sem precedentes.
Os híbridos são geralmente variedades mais frágeis e mais exigentes do que as variedades rústicas. Por exemplo, o sistema radicular dos milhos híbridos é atrofiado. É insuficiente para que a planta recolha do solo a água e os nutrientes de que necessita. A planta é frágil e particularmente sensível à sequia. Tornou-se necessário encontrar soluções para assegurar a saúde destas culturas. Ao mesmo tempo que as grandes áreas cobertas por uma mesma cultura aumentavam muito os riscos de doenças e a sua velocidade de propagação.
Os tratamentos químicos e pesticidas foram a resposta a estes problemas de “saúde” das culturas. Os campos tornaram-se campos de batalha, o terreno duma guerra química que nos opõe a todas as formas de Vida que comprometam as nossas expectativas de rendimento. Além disso, estas armas químicas foram produzidas pelos mesmos fabricantes de armas, parcialmente reconvertidos. Monsanto, por exemplo, foi o fabricante do gás mostarda utilizado na I Guerra Mundial, e do agente laranja utilizado no Vietname.
Um solo cultivado quimicamente deixa de conter húmus. A vida orgânica do solo, responsável pela sua fertilidade natural, é destruída pelos vários –cidas que impregnam o solo depois da pulverização. O recurso aos adubos químicos tornou-se indispensável. E quem é que se encarregou de produzir e comercializar os adubos químicos? As mesmas multinacionais que vendem os –cidas e as sementes híbridas. São hoje os promotores dos OGM. As multinacionais da agroquímica conheceram um desenvolvimento vertiginoso depois dos anos 50. Estão hoje entre os maiores potentados económicos do mundo.
Do alto dos seus imensos tractores e outras máquinas, os agricultores de hoje já não têm os pés sobre a terra. Por vezes nem têm consciência do estado do solo. Já não o tocam, nem o sentem, e só o vêm lá do alto. As quantidades de produtos químicos, a sua complexidade e usos cumulativos não cessaram de aumentar nos últimos 50 anos. 500 mil toneladas de produtos activos são disseminados pelo mundo todos os anos. Esta quantidade triplicou nos últimos 15 anos, e continua a aumentar. Se começam a surgir esforços para reduzir progressivamente o uso destes produtos nos nossos países desenvolvidos, a verdade é que o seu uso continua a expandir-se por todo o planeta.
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A REVOLUÇÃO VERDE
Só uma estratégia permitia vencer estes dois desafios duma só vez: para aumentar os rendimentos agrícolas, forçando os camponeses a deixar as suas terras, bastou fazer a própria agricultura entrar na era industrial. O emparcelamento foi feito neste sentido, favorecendo as grandes áreas dum só terratenente, em prejuízo das pequenas parcelas. As grandes explorações foram privilegiadas, tendo sido subvencionadas para se mecanizarem. Algumas taxas, até então indexadas à área cultivada, tornaram-se acidentais. Proporcionalmente, os encargos das grandes explorações foram aligeirados, e as dos mais pequenos aumentaram. As produções aduzidas pela mecanização e a química fizeram baixar o preço dos produtos alimentares, arrastando os rendimentos dos pequenos camponeses. Foi assim que a pobreza dos pequenos camponeses se acentuou, durante o que chamámos a revolução verde.
Pais trabalhando de sol a sol, seis dias por semana, filhos nos campos após a escola e durante as férias, os fins do mês a pão e leite… são uma outra realidade vivida por milhões de jovens franceses nos anos 50 e 60. Os “happy days”, a “trintena gloriosa”, a “febre de sábado” não foram para toda a gente. Os cursos de jardinagem foram suprimidos dos programas escolares, a publicidade e as tentações do mundo moderno multiplicaram-se… e aconteceu o êxodo rural que fora programado. Os relatórios remetidos ao gen. De Gaulle em 1950 não estavam errados: diziam eles que, criando uma significativa diferença de nível de vida entre o campo e as cidades, o êxodo das populações rurais para as luzes das cidades far-se-ia “naturalmente”.
O desenvolvimento do modo de vida urbano gerou novas necessidades: electrodomésticos, viaturas, mobiliário, passatempos, vestuário na moda… a sociedade de consumo estava em marcha. A maior parte destes bens de consumo era então produzida localmente. A sua fabricação acentuou a necessidade de mão-de-obra nas minas e nas fábricas.
A migração para a cidade gerou igualmente necessidades de alojamento. A construção de casas exigiu mais mão-de-obra. A nossa economia foi então tomada por uma fuga em frente, que hoje pode parecer surrealista: uma fuga em frente da parte do trabalho, responsável pela penúria de mão-de-obra.
Produzir mais com menos braços, tal foi a divisa do mundo industrial, assim como do mundo agrícola. Além das medidas fiscais, das subvenções e do emparcelamento, a ciência e as tecnologias foram postas ao serviço desta exigência.
Na agricultura, foram seleccionadas e melhoradas por hibridação as variedades cultivadas. Estes híbridos deviam oferecer:
- alto rendimento por hectare; crescimento rápido, em volume e em número; plantas adaptadas ao cultivo mecanizado; produtos fáceis de transportar, armazenar e conservar; variedades mais fáceis de cultivar e colher; legumes maiores e com melhor aspecto, etc.
Por exemplo, o trigo hoje cultivado cresce mais depressa e é menos alto do que as antigas variedades rústicas. Isso impede que as plantas se dobrem para o solo antes da ceifa, permitindo acelerar a rotação das culturas.
O cultivo de plantas híbridas tornou-se a norma. As sementes híbridas são protegidas por patentes, e não reproduzem as suas características de geração em geração. Assim, os agricultores têm que comprar novas sementes todos os anos. Perdem assim uma sabedoria fundamental: a produção das próprias sementes. Os sementeiros ganharam um poder sem precedentes.
Os híbridos são geralmente variedades mais frágeis e mais exigentes do que as variedades rústicas. Por exemplo, o sistema radicular dos milhos híbridos é atrofiado. É insuficiente para que a planta recolha do solo a água e os nutrientes de que necessita. A planta é frágil e particularmente sensível à sequia. Tornou-se necessário encontrar soluções para assegurar a saúde destas culturas. Ao mesmo tempo que as grandes áreas cobertas por uma mesma cultura aumentavam muito os riscos de doenças e a sua velocidade de propagação.
Os tratamentos químicos e pesticidas foram a resposta a estes problemas de “saúde” das culturas. Os campos tornaram-se campos de batalha, o terreno duma guerra química que nos opõe a todas as formas de Vida que comprometam as nossas expectativas de rendimento. Além disso, estas armas químicas foram produzidas pelos mesmos fabricantes de armas, parcialmente reconvertidos. Monsanto, por exemplo, foi o fabricante do gás mostarda utilizado na I Guerra Mundial, e do agente laranja utilizado no Vietname.
Um solo cultivado quimicamente deixa de conter húmus. A vida orgânica do solo, responsável pela sua fertilidade natural, é destruída pelos vários –cidas que impregnam o solo depois da pulverização. O recurso aos adubos químicos tornou-se indispensável. E quem é que se encarregou de produzir e comercializar os adubos químicos? As mesmas multinacionais que vendem os –cidas e as sementes híbridas. São hoje os promotores dos OGM. As multinacionais da agroquímica conheceram um desenvolvimento vertiginoso depois dos anos 50. Estão hoje entre os maiores potentados económicos do mundo.
Do alto dos seus imensos tractores e outras máquinas, os agricultores de hoje já não têm os pés sobre a terra. Por vezes nem têm consciência do estado do solo. Já não o tocam, nem o sentem, e só o vêm lá do alto. As quantidades de produtos químicos, a sua complexidade e usos cumulativos não cessaram de aumentar nos últimos 50 anos. 500 mil toneladas de produtos activos são disseminados pelo mundo todos os anos. Esta quantidade triplicou nos últimos 15 anos, e continua a aumentar. Se começam a surgir esforços para reduzir progressivamente o uso destes produtos nos nossos países desenvolvidos, a verdade é que o seu uso continua a expandir-se por todo o planeta.
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quarta-feira, 13 de outubro de 2010
Hora do folhetim - 38
(...)
Tinham-se mantido silenciosos durante todo o dia, uma vez que o voo a tão grande altitude exigia todas as energias de que dispunham. Mas agora, ao conduzir a fêmea descendo a pique entre paredes de nuvens, o maçaricão gritava, excitado. O pequeno buraco alargou-se e o ar assobiava à sua volta. Voavam em glissagens laterais, para reduzir a velocidade de descida. A princípio o ar era tão rarefeito que não podiam travar com as asas. Quase não tinham controle sobre si, e despenhavam-se de encontro ao solo. Mas o ar tornou-se mais denso, forneceu resistência às asas, e começaram a descer mais lentamente. A pressão mudava tão abruptamente que causava dores nos ouvidos. Depois de passarem a camada de nuvens, nivelaram o voo e dirigiram-se para o Pacífico, que viam no horizonte, como uma leve linha azul.
Em dois ou três minutos tinham chegado com uma rapidez dramática a regiões muito diferentes do ermo gelado e claro de há pouco. Voavam ainda tão alto que só podiam distinguir contornos difusos. Muito embora, a terra era de novo sua. Lá em baixo havia solo e pedras e plantas, não já o nada aéreo das nuvens. Aqui o céu era opaco, não havia sol nem qualquer luz brilhava, mas a atmosfera era quente. E sentia-se o ar de novo. Ele tinha de novo substância, dava às asas força e impulso e enchia os pulmões, sem que, ao expirar, eles sofressem de dolorosa dispneia.
Apressadamente continuaram em frente, seguindo o terreno que caía a pique. Poisaram, já tarde avançada, numa estreita faixa de praia, no Pacífico. Durante alguns minutos beberam sofregamente água salgada. Depois comeram, até escurecer.
Ao crepúsculo clareou um pouco, e os grandes cones vulcânicos dos Andes desenhavam-se cruamente a leste, no céu cinzento, ganhando um ímpeto e uma força aterradores. Todos os anos o instinto do maçaricão o conduzia sobre esta poderosa barreira de calcário, de tempestades e de neve. E todos os anos ele lançava um olhar para trás, antes que a lembrança se lhe apagasse. Por mais lento de raciocínio que fosse o seu cérebro, ficava sempre espantado com a resistência das asas.
O CORREDOR DA MORTE
A comissão de protecção das aves receia que tenham de ser colocadas na lista dos animais ameaçados de extinção as seguintes espécies: o condor californiano ( em 1939 já não existiam sequer 50 exemplares), o bico-de-marfim (são conhecidas menos de 30 aves), o maçaricão-esquimó (efectivo desconhecido, caso ainda exista)...
Não temos disponível nenhuma outra informação sobre o maçaricão-esquimó. É perfeitamente possível que esta ave esteja extinta. Mas os relatos esporádicos de que dispomos, relativos aos últimos dez anos, deixam a esperança de que ele tenha sido casualmente avistado por alguns observadores. Apesar disso parece-nos aconselhável que a Liga Americana de Ornitólogos estabeleça ligação, seja na Argentina ou noutras repúblicas sul-americanas, com organizações ou pessoas individuais que estejam em condições de efectuar novas pesquisas. No caso de serem detectados maçaricões-esquimós que passam o inverno na Argentina, poderiam ser tomadas medidas que lhes garantam uma melhor protecção, seja através da direcção do Parque Nacional Argentino, seja de qualquer outro modo...
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Tinham-se mantido silenciosos durante todo o dia, uma vez que o voo a tão grande altitude exigia todas as energias de que dispunham. Mas agora, ao conduzir a fêmea descendo a pique entre paredes de nuvens, o maçaricão gritava, excitado. O pequeno buraco alargou-se e o ar assobiava à sua volta. Voavam em glissagens laterais, para reduzir a velocidade de descida. A princípio o ar era tão rarefeito que não podiam travar com as asas. Quase não tinham controle sobre si, e despenhavam-se de encontro ao solo. Mas o ar tornou-se mais denso, forneceu resistência às asas, e começaram a descer mais lentamente. A pressão mudava tão abruptamente que causava dores nos ouvidos. Depois de passarem a camada de nuvens, nivelaram o voo e dirigiram-se para o Pacífico, que viam no horizonte, como uma leve linha azul.
Em dois ou três minutos tinham chegado com uma rapidez dramática a regiões muito diferentes do ermo gelado e claro de há pouco. Voavam ainda tão alto que só podiam distinguir contornos difusos. Muito embora, a terra era de novo sua. Lá em baixo havia solo e pedras e plantas, não já o nada aéreo das nuvens. Aqui o céu era opaco, não havia sol nem qualquer luz brilhava, mas a atmosfera era quente. E sentia-se o ar de novo. Ele tinha de novo substância, dava às asas força e impulso e enchia os pulmões, sem que, ao expirar, eles sofressem de dolorosa dispneia.
Apressadamente continuaram em frente, seguindo o terreno que caía a pique. Poisaram, já tarde avançada, numa estreita faixa de praia, no Pacífico. Durante alguns minutos beberam sofregamente água salgada. Depois comeram, até escurecer.
Ao crepúsculo clareou um pouco, e os grandes cones vulcânicos dos Andes desenhavam-se cruamente a leste, no céu cinzento, ganhando um ímpeto e uma força aterradores. Todos os anos o instinto do maçaricão o conduzia sobre esta poderosa barreira de calcário, de tempestades e de neve. E todos os anos ele lançava um olhar para trás, antes que a lembrança se lhe apagasse. Por mais lento de raciocínio que fosse o seu cérebro, ficava sempre espantado com a resistência das asas.
O CORREDOR DA MORTE
A comissão de protecção das aves receia que tenham de ser colocadas na lista dos animais ameaçados de extinção as seguintes espécies: o condor californiano ( em 1939 já não existiam sequer 50 exemplares), o bico-de-marfim (são conhecidas menos de 30 aves), o maçaricão-esquimó (efectivo desconhecido, caso ainda exista)...
Não temos disponível nenhuma outra informação sobre o maçaricão-esquimó. É perfeitamente possível que esta ave esteja extinta. Mas os relatos esporádicos de que dispomos, relativos aos últimos dez anos, deixam a esperança de que ele tenha sido casualmente avistado por alguns observadores. Apesar disso parece-nos aconselhável que a Liga Americana de Ornitólogos estabeleça ligação, seja na Argentina ou noutras repúblicas sul-americanas, com organizações ou pessoas individuais que estejam em condições de efectuar novas pesquisas. No caso de serem detectados maçaricões-esquimós que passam o inverno na Argentina, poderiam ser tomadas medidas que lhes garantam uma melhor protecção, seja através da direcção do Parque Nacional Argentino, seja de qualquer outro modo...
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Planeta-Mãe - 27
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A FRANÇA TINHA NECESSIDADE DE BRAÇOS
Antes da 2ª Guerra Mundial, a principal actividade do país era uma actividade vital: alimentar-se e alimentar os outros.
Mesmo se a migração para as cidades tinha começado no início do séc. XX, a população era ainda maioritariamente camponesa em 1938. Como todos os países, a França servia-se desta população camponesa, para responder a todos os desafios da Nação. Mas desta vez não era questão de lançar uma ordem de mobilização, como tinha acontecido em todas as guerras. A carne dos camponeses tinha alimentado canhões bastantes. Não era questão de voltar a tocar o eterno ritornello do orgulho nacional e do amor à Pátria, para convencer os camponeses a deixar as suas terras e famílias.
Como levar milhões de camponeses tradicionais a abandonar as suas quintas ancestrais? Como convencê-los a migrar para as cidades industriais e mineiras? Como empurrá-los dos campos para as oficinas, da terra para as máquinas? Como fazer aceitar a ideia de se deixar alimentar por outros, a pessoas que sempre se alimentaram a si próprias? O recurso à imigração, só por si, não podia preencher o deficit de mão-de-obra. O governo da época tinha assim que encontrar resposta a estas questões.
Fazer mudar mentalidades a este ponto não era o menor dos desafios políticos do pós-guerra. Ultrapassar este desafio implicava vencer um outro: Produzir mais alimentos com menos mão-de-obra!
Diminuindo o número de camponeses, iria evoluir radicalmente a relação entre o número de pessoas produtoras de alimentos e aquelas que se deixam alimentar. Para fazer face a esta revolução da sociedade, deviam ser consideravelmente melhorados os rendimentos agrícolas. Para isso, a agricultura tinha que viver uma revolução. E esta revolução agrícola também tinha sido planificada pelo plano Marshall.
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A FRANÇA TINHA NECESSIDADE DE BRAÇOS
Antes da 2ª Guerra Mundial, a principal actividade do país era uma actividade vital: alimentar-se e alimentar os outros.
Mesmo se a migração para as cidades tinha começado no início do séc. XX, a população era ainda maioritariamente camponesa em 1938. Como todos os países, a França servia-se desta população camponesa, para responder a todos os desafios da Nação. Mas desta vez não era questão de lançar uma ordem de mobilização, como tinha acontecido em todas as guerras. A carne dos camponeses tinha alimentado canhões bastantes. Não era questão de voltar a tocar o eterno ritornello do orgulho nacional e do amor à Pátria, para convencer os camponeses a deixar as suas terras e famílias.
Como levar milhões de camponeses tradicionais a abandonar as suas quintas ancestrais? Como convencê-los a migrar para as cidades industriais e mineiras? Como empurrá-los dos campos para as oficinas, da terra para as máquinas? Como fazer aceitar a ideia de se deixar alimentar por outros, a pessoas que sempre se alimentaram a si próprias? O recurso à imigração, só por si, não podia preencher o deficit de mão-de-obra. O governo da época tinha assim que encontrar resposta a estas questões.
Fazer mudar mentalidades a este ponto não era o menor dos desafios políticos do pós-guerra. Ultrapassar este desafio implicava vencer um outro: Produzir mais alimentos com menos mão-de-obra!
Diminuindo o número de camponeses, iria evoluir radicalmente a relação entre o número de pessoas produtoras de alimentos e aquelas que se deixam alimentar. Para fazer face a esta revolução da sociedade, deviam ser consideravelmente melhorados os rendimentos agrícolas. Para isso, a agricultura tinha que viver uma revolução. E esta revolução agrícola também tinha sido planificada pelo plano Marshall.
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sexta-feira, 24 de setembro de 2010
Hora do folhetim - 37
(...)
Os maçaricões voavam rente à camada de nuvens, ao encontro do pico. Avançavam lenta e penosamente. Voavam de bico aberto, ofegantes no ar rarefeito, e os corpos doíam-lhes.
Ao aproximarem-se do cume o vento refrescou de novo. Farrapos de neve turbilhonavam pela encosta. Evitaram-nos e poisaram, para descansar, numa aresta do penhasco, donde o vento varrera a neve. E de novo tinham que padecer. O ar seco e rarefeito tinha perturbado fortemente o equilíbrio dos seus líquidos. As gargantas ardiam-lhes de sede.
Menos de cem quilómetros adiante floriam exuberantes orquídeas e cactos do verão tardio sul-americano. Mas aqui, no tecto das duas Américas, seis mil metros acima do nível do mar, reinava um inverno sem fim. Mesmo por baixo deles encontrava-se um mundo incerto e medonho. Massas brancas misturavam-se umas nas outras, mal se distinguia onde terminavam os montes nevados e começavam as nuvens. Nenhuma criatura podia manter-se aqui por muito tempo. E apesar disso encontravam-se traços de vida, uma vez que grande parte da falésia era constituída por esqueletos fossilizados de animais marinhos, que tinham vivido há milhões de anos, quando os continentes ainda não existiam, e o cume da montanha era apenas lodo no fundo dos oceanos.
As dores abrandaram e os maçaricões continuaram a voar para oeste, sobre a neve que o vento tinha moldado, através da paisagem livre e vazia da luz clara do sol, sobre as nuvens. Longo tempo continuaram em frente, evitando o manto de nuvens, pelo menos quando não sabiam exactamente o que havia lá por baixo. Atrás deles desapareceu o pico, num véu de neve e neblina. Então abriu-se o tapete de nuvens. A camada contínua e plana deu lugar a fundas depressões de causar vertigens, e a elevadas colunas brancas. Vieram ainda poços maiores, e num deles caíam a pique as paredes sem fundo. Através dele avistaram um planalto arenoso, parecido com um deserto, com manchas verdes e castanhas - cactos e cascalho. Estava quatro ou cinco mil metros abaixo deles, pois a oeste caíam os Andes abruptamente para o Pacífico.
Os maçaricões voavam rente à camada de nuvens, ao encontro do pico. Avançavam lenta e penosamente. Voavam de bico aberto, ofegantes no ar rarefeito, e os corpos doíam-lhes.
Ao aproximarem-se do cume o vento refrescou de novo. Farrapos de neve turbilhonavam pela encosta. Evitaram-nos e poisaram, para descansar, numa aresta do penhasco, donde o vento varrera a neve. E de novo tinham que padecer. O ar seco e rarefeito tinha perturbado fortemente o equilíbrio dos seus líquidos. As gargantas ardiam-lhes de sede.
Menos de cem quilómetros adiante floriam exuberantes orquídeas e cactos do verão tardio sul-americano. Mas aqui, no tecto das duas Américas, seis mil metros acima do nível do mar, reinava um inverno sem fim. Mesmo por baixo deles encontrava-se um mundo incerto e medonho. Massas brancas misturavam-se umas nas outras, mal se distinguia onde terminavam os montes nevados e começavam as nuvens. Nenhuma criatura podia manter-se aqui por muito tempo. E apesar disso encontravam-se traços de vida, uma vez que grande parte da falésia era constituída por esqueletos fossilizados de animais marinhos, que tinham vivido há milhões de anos, quando os continentes ainda não existiam, e o cume da montanha era apenas lodo no fundo dos oceanos.
As dores abrandaram e os maçaricões continuaram a voar para oeste, sobre a neve que o vento tinha moldado, através da paisagem livre e vazia da luz clara do sol, sobre as nuvens. Longo tempo continuaram em frente, evitando o manto de nuvens, pelo menos quando não sabiam exactamente o que havia lá por baixo. Atrás deles desapareceu o pico, num véu de neve e neblina. Então abriu-se o tapete de nuvens. A camada contínua e plana deu lugar a fundas depressões de causar vertigens, e a elevadas colunas brancas. Vieram ainda poços maiores, e num deles caíam a pique as paredes sem fundo. Através dele avistaram um planalto arenoso, parecido com um deserto, com manchas verdes e castanhas - cactos e cascalho. Estava quatro ou cinco mil metros abaixo deles, pois a oeste caíam os Andes abruptamente para o Pacífico.
domingo, 19 de setembro de 2010
Planeta-Mãe - 26
REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E ÊXODO RURAL
Reunidos em Londres em 1948, os cinco dirigentes dos países “vencedores” da guerra decidiram sobre a nova imagem que o mundo tomar. Era preciso reconstruir a Europa. Inspirada pelos Estados Unidos, a escolha foi instaurar um novo modelo de sociedade industrial.
A construção desta nova sociedade exigia muito dinheiro. E foi financiada pelos americanos, através do expediente do plano Marshall.
O estabelecimento e funcionamento deste modelo industrial exigia também energia barata: foi o petróleo.
Neste momento da História, a disponibilidade e o preço do petróleo não constituíam preocupação. Os países colonizados ainda se não tinham emancipado. Nós próprios fixávamos o preço da energia, que extraíamos em terra estrangeira. A nossa hegemonia mundial permitia deitar a mão ao essencial dos recursos naturais necessários ao nosso desenvolvimento industrial.
Mas esse desenvolvimento dependia também dum outro recurso: a mão-de-obra. Depois dos 50 milhões de mortos da 2ª Guerra Mundial, dos 2,5 milhões da 1ª, dos 50 a 100 milhões de mortos da pandemia de gripe aviaria de 1918, depois dos anos de fraca natalidade ligada aos conflitos e à grande recessão dos anos 30, eram escassas as forças vivas nos países ocidentais.
(...)
Reunidos em Londres em 1948, os cinco dirigentes dos países “vencedores” da guerra decidiram sobre a nova imagem que o mundo tomar. Era preciso reconstruir a Europa. Inspirada pelos Estados Unidos, a escolha foi instaurar um novo modelo de sociedade industrial.
A construção desta nova sociedade exigia muito dinheiro. E foi financiada pelos americanos, através do expediente do plano Marshall.
O estabelecimento e funcionamento deste modelo industrial exigia também energia barata: foi o petróleo.
Neste momento da História, a disponibilidade e o preço do petróleo não constituíam preocupação. Os países colonizados ainda se não tinham emancipado. Nós próprios fixávamos o preço da energia, que extraíamos em terra estrangeira. A nossa hegemonia mundial permitia deitar a mão ao essencial dos recursos naturais necessários ao nosso desenvolvimento industrial.
Mas esse desenvolvimento dependia também dum outro recurso: a mão-de-obra. Depois dos 50 milhões de mortos da 2ª Guerra Mundial, dos 2,5 milhões da 1ª, dos 50 a 100 milhões de mortos da pandemia de gripe aviaria de 1918, depois dos anos de fraca natalidade ligada aos conflitos e à grande recessão dos anos 30, eram escassas as forças vivas nos países ocidentais.
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sábado, 11 de setembro de 2010
Pré-história
No princípio era um grupo de caçadores-recolectores. Abrigavam-se em cavernas de cimento, alimentavam-se do que havia à mão.
O aparecimento da horta abriu as portas a outra civilização.
O aparecimento da horta abriu as portas a outra civilização.
quinta-feira, 9 de setembro de 2010
Hora do folhetim - 36
(...)
Pela manhã o vento amainou. O macho sabia que tinham de continuar a voar, não podiam ficar ali mais tempo. Quando as nuvens carregadas de neve se dissolveram e o sol atravessou a névoa com uma luz amarelada, levantaram voo e avançaram para o manto que ocultava os cumes. Um minuto depois encontravam-se num mundo fantástico de neblina branca, cuja humidade lhes pesava nas penas. Subiam penosamente, em círculos. Tinham de ganhar altitude, mas o ar era agora tão rarefeito que pareciam mover-se no vazio. Mesmo com os pulmões cheios, respiravam com dificuldade.
A camada de nuvens era muito instável e cheia de turbulências. Ocasionalmente encontravam camadas de ar mais denso, que as asas cortavam melhor, e ganhavam altitude rapidamente. Mas logo o ar se rarefazia, e, por momentos, mal se podiam manter. Uma vez clareou por cima deles, e o maçaricão sabia que estavam perto de atingir o céu claro. Mas, antes de conseguirem furar as nuvens, uma rajada descendente arrastou-os consigo. Caíram desamparados, e perderam em poucos segundos a altitude que lhes tinha levado muitos minutos a ganhar.
Finalmente deixaram para trás as agitadas camadas de nuvens e voaram através dum céu claro e tranquilo. Era um estranho mundo encantado, de um frio penetrante e uma luz que cegava, e que parecia desligado de tudo o que havia na terra. A camada de nuvens estendia-se por todo o horizonte, uma planície branca, ondulada e vastíssima. Quase parecia sólida bastante para poisarem. O sol reflectia nela o seu brilho intenso. Mil e quinhentos metros adiante deles uma montanha nevada rompia as nuvens. O seu cume era um penhasco nu e inteiriçado. Ao longe havia outros cumes, como ilhas, num mar de brancura.
(...)
Pela manhã o vento amainou. O macho sabia que tinham de continuar a voar, não podiam ficar ali mais tempo. Quando as nuvens carregadas de neve se dissolveram e o sol atravessou a névoa com uma luz amarelada, levantaram voo e avançaram para o manto que ocultava os cumes. Um minuto depois encontravam-se num mundo fantástico de neblina branca, cuja humidade lhes pesava nas penas. Subiam penosamente, em círculos. Tinham de ganhar altitude, mas o ar era agora tão rarefeito que pareciam mover-se no vazio. Mesmo com os pulmões cheios, respiravam com dificuldade.
A camada de nuvens era muito instável e cheia de turbulências. Ocasionalmente encontravam camadas de ar mais denso, que as asas cortavam melhor, e ganhavam altitude rapidamente. Mas logo o ar se rarefazia, e, por momentos, mal se podiam manter. Uma vez clareou por cima deles, e o maçaricão sabia que estavam perto de atingir o céu claro. Mas, antes de conseguirem furar as nuvens, uma rajada descendente arrastou-os consigo. Caíram desamparados, e perderam em poucos segundos a altitude que lhes tinha levado muitos minutos a ganhar.
Finalmente deixaram para trás as agitadas camadas de nuvens e voaram através dum céu claro e tranquilo. Era um estranho mundo encantado, de um frio penetrante e uma luz que cegava, e que parecia desligado de tudo o que havia na terra. A camada de nuvens estendia-se por todo o horizonte, uma planície branca, ondulada e vastíssima. Quase parecia sólida bastante para poisarem. O sol reflectia nela o seu brilho intenso. Mil e quinhentos metros adiante deles uma montanha nevada rompia as nuvens. O seu cume era um penhasco nu e inteiriçado. Ao longe havia outros cumes, como ilhas, num mar de brancura.
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Planeta-Mãe - 25
COMO É QUE CHEGÁMOS AQUI?
UM MUNDO MODERNO
O caminho que nos conduziu à situação actual começou a percorrer-se há vários milhares de anos. Em certas regiões do mundo, os homens deixaram de ser caçadores-recolectores. Tendo aprendido a cultivar, tornaram-se sedentários. Estas mudanças do modo de vida alteraram muitas coisas, mormente a nossa maneira de pensar e a nossa relação com a Natureza.
A partir do séc. XIV, o nosso modelo de sociedade expandiu-se progressivamente pelo planeta, graças aos progressos da navegação. Tribos de África e América do Sul, ameríndios, aborígenes da Austrália… o modo de vida ancestral de numerosas populações acabou por desaparecer. E é verdade que os conquistadores ocidentais tinham argumentos convincentes: as armas de fogo.
Mas uma nova mudança de sociedade se impôs no Ocidente, no séc. XX, sempre em ligação com a agricultura e a maneira de se alimentar. Tudo acelerou há somente 50 anos. Desta vez bastaram alguns decénios para mundializar uma nova maneira de viver, de pensar, e de perceber a Natureza.
(...)
UM MUNDO MODERNO
O caminho que nos conduziu à situação actual começou a percorrer-se há vários milhares de anos. Em certas regiões do mundo, os homens deixaram de ser caçadores-recolectores. Tendo aprendido a cultivar, tornaram-se sedentários. Estas mudanças do modo de vida alteraram muitas coisas, mormente a nossa maneira de pensar e a nossa relação com a Natureza.
A partir do séc. XIV, o nosso modelo de sociedade expandiu-se progressivamente pelo planeta, graças aos progressos da navegação. Tribos de África e América do Sul, ameríndios, aborígenes da Austrália… o modo de vida ancestral de numerosas populações acabou por desaparecer. E é verdade que os conquistadores ocidentais tinham argumentos convincentes: as armas de fogo.
Mas uma nova mudança de sociedade se impôs no Ocidente, no séc. XX, sempre em ligação com a agricultura e a maneira de se alimentar. Tudo acelerou há somente 50 anos. Desta vez bastaram alguns decénios para mundializar uma nova maneira de viver, de pensar, e de perceber a Natureza.
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quinta-feira, 2 de setembro de 2010
Hora do folhetim - 35
(...)
A luz da manhã caiu sobre um mundo áspero e desolado, sobre uma paisagem que ia crescendo para o céu. Falésias cinzentas e pedaços de nuvens em movimento, que pareciam asas brancas de um vento eterno. E ainda não tinham atingido o ponto mais alto. Os cumes que tinham agora de ultrapassar estavam escondidos atrás de massas de nuvens agitadas. Em nenhum outro lugar do mundo, salvo nos Himalaias, se encontram altitudes tão elevadas.
Mas mesmo aqui viviam insectos, e os maçaricões puseram-se à procura de alimento. Era uma operação lenta e difícil, não por haver pouco alimento, mas porque cada movimento era extenuante, exigindo muito oxigénio, que eles só a custo conseguiam levar à circulação sanguínea. À noite o ar arrefeceu rapidamente. Começou a nevar e eles não reiniciaram o voo. As turbulências atmosféricas e as enormes barreiras de falésias e glaciares só podiam ser ultrapassadas com a luz do dia.
Nessa noite não puderam dormir, e quase não descansaram. O vento rugia estridente contra a parede da falésia e empurrava os duros flocos de neve. Por momentos, as aves mal se puderam resguardar. Então uma poderosa rajada retirou-lhes o chão debaixo dos pés e arremessou-os na escuridão, no medonho vazio do espaço. O macho lutou, defendeu-se, retomou o controle das asas e poisou. Mas a fêmea tinha desaparecido.
Desesperado, tentou gritar mais alto que o rugido da tempestade. O vento não trouxe qualquer resposta, para além dos seus próprios gritos. Quando este amainou o maçaricão levantou voo, descreveu pequenos círculos a baixa altitude, gritou, e procurou, e gritou em vão. O vento cresceu de novo e ele não pôde manter-se em voo. Agarrou-se aos musgos da falésia e esperou, sem respiração. A tempestade amainou por um momento e ele voltou a levantar voo, mas a sua resistência acabou rapidamente. Não podia continuar. Então encontrou um buraco na falésia que o defendeu da tempestade. Encolheu-se lá dentro, arfando, de bido aberto. O corpo precisava de oxigénio. Logo que recuperou forças, voou de novo pela noite escura e bravia, descreveu os seus círculos e gritou pela fêmea. Torturava-o a antiga solidão.
Encontrou-a uma hora depois. Tinha-se escondido da tempestade por baixo duma saliência de xisto, na falésia, e estava tão perturbada e exangue como ele. Encostaram-se um ao outro, e o calor dos corpos derreteu um pequeno círculo de neve dura e granulosa.
(...)
A luz da manhã caiu sobre um mundo áspero e desolado, sobre uma paisagem que ia crescendo para o céu. Falésias cinzentas e pedaços de nuvens em movimento, que pareciam asas brancas de um vento eterno. E ainda não tinham atingido o ponto mais alto. Os cumes que tinham agora de ultrapassar estavam escondidos atrás de massas de nuvens agitadas. Em nenhum outro lugar do mundo, salvo nos Himalaias, se encontram altitudes tão elevadas.
Mas mesmo aqui viviam insectos, e os maçaricões puseram-se à procura de alimento. Era uma operação lenta e difícil, não por haver pouco alimento, mas porque cada movimento era extenuante, exigindo muito oxigénio, que eles só a custo conseguiam levar à circulação sanguínea. À noite o ar arrefeceu rapidamente. Começou a nevar e eles não reiniciaram o voo. As turbulências atmosféricas e as enormes barreiras de falésias e glaciares só podiam ser ultrapassadas com a luz do dia.
Nessa noite não puderam dormir, e quase não descansaram. O vento rugia estridente contra a parede da falésia e empurrava os duros flocos de neve. Por momentos, as aves mal se puderam resguardar. Então uma poderosa rajada retirou-lhes o chão debaixo dos pés e arremessou-os na escuridão, no medonho vazio do espaço. O macho lutou, defendeu-se, retomou o controle das asas e poisou. Mas a fêmea tinha desaparecido.
Desesperado, tentou gritar mais alto que o rugido da tempestade. O vento não trouxe qualquer resposta, para além dos seus próprios gritos. Quando este amainou o maçaricão levantou voo, descreveu pequenos círculos a baixa altitude, gritou, e procurou, e gritou em vão. O vento cresceu de novo e ele não pôde manter-se em voo. Agarrou-se aos musgos da falésia e esperou, sem respiração. A tempestade amainou por um momento e ele voltou a levantar voo, mas a sua resistência acabou rapidamente. Não podia continuar. Então encontrou um buraco na falésia que o defendeu da tempestade. Encolheu-se lá dentro, arfando, de bido aberto. O corpo precisava de oxigénio. Logo que recuperou forças, voou de novo pela noite escura e bravia, descreveu os seus círculos e gritou pela fêmea. Torturava-o a antiga solidão.
Encontrou-a uma hora depois. Tinha-se escondido da tempestade por baixo duma saliência de xisto, na falésia, e estava tão perturbada e exangue como ele. Encostaram-se um ao outro, e o calor dos corpos derreteu um pequeno círculo de neve dura e granulosa.
(...)
quarta-feira, 1 de setembro de 2010
Planeta-Mãe - 24
(…)
CONCLUSÃO SOBRE O RISCO DE PENÚRIA ALIMENTAR
O QUE É QUE PODERIA EVITAR QUE ELA ACONTEÇA?
Tendo em conta os factores que condicionam a baixa da produtividade, e aqueles que aceleram o aumento da procura, a questão que hoje se coloca, sobre a penúria alimentar, é saber se ainda a podemos evitar.
Para evitar uma crise alimentar generalizada, seriam necessárias mudanças que permitissem inverter radical e rapidamente todos os fenómenos anteriormente descritos. Isto é, mudar radical e rapidamente o regime alimentar e o modo de vida das populações ocidentais, modificando ao mesmo tempo os nossos métodos de cultura à escala do planeta.
Reconverter um campo de milho cultivado quimicamente, num campo de batatas, de nabos ou cenouras, não se faz dum dia para o outro. Mas a sensação de fome começa desde a primeira refeição aligeirada ou adiada.
Esperar que uma parte da população ocidental viva esta situação extrema, para iniciar as mudanças necessárias, expõe-nos a perigos graves. As consequências económicas, sociais e políticas seriam à medida da nossa teimosia, durante os decénios passados.
QUANDO É QUE ELA AMEAÇA CHEGAR?
A esta questão podemos responder que ela já está em curso, uma vez que um bilião de seres humanos vive todos os dias a sensação de fome.
No Ocidente, tem sido graças aos stocks dos anos passados que até agora temos escapado à crise alimentar. Estando os stocks mundiais em baixo, bastará um ano de colheitas calamitosas para que sejamos confrontados com ela. Inversamente, boas colheitas concedem-nos todos os anos um adiamento.
COMO É QUE A CRISE PODE SER DESENCADEADA?
Dois cenários são possíveis. O primeiro exclui qualquer acontecimento excepcional. Neste caso prosseguiriam as tendências de fundo, com repercussões mais ou menos marcadas sobre as colheitas, conforme os anos. As tensões sobre os mercados dos produtos agrícolas subiriam progressivamente. Seriam cada vez mais frequentes as situações críticas, e cada vez mais próximas de nós. A subida dos preços aconteceria lentamente, na continuidade do que conhecemos há alguns anos. Certos alimentos acabariam por faltar, depois outros, etc.
O segundo cenário tem em conta numerosos acontecimentos excepcionais, susceptíveis de acelerar as tendências em curso: fenómenos climáticos maiores, aparecimento de pestes vegetais, ou outras pragas resistentes aos tratamentos, falta de água, epizootias nos estábulos, etc. Neste cenário tudo pode alterar-se em apenas algumas semanas. A explosão dos preços seria então vertiginosa e brutal. A fome poderia afectar uma parte da população ocidental em muito pouco tempo. Estes acontecimentos mais não fariam do que revelar-nos brutalmente as consequências dos nossos actos passados.
INTERDEPENDÊNCIA
Interdependência e interacção são também princípios aplicáveis às causas acima descritas. Por exemplo, as faltas de água, as grandes amplitudes térmicas ou as chuvas fortes, têm sobre os rendimentos um impacto não só directo, mas também indirecto. Criam circunstâncias propícias ao desenvolvimento de doenças.
A interacção dos fenómenos aplica-se a uma escala global. Outros factores, aparentemente estranhos à actividade agrícola, podem desempenhar um papel maior na evolução das tendências em curso. A crise financeira, ou as tensões internacionais que perturbem as trocas comerciais, são apenas dois exemplos. Mais surpreendente ainda, uma pandemia mundial de gripe, suína ou aviária, teria impacto nos mercados sobre a procura: os consumidores voltar-se-iam certamente para os cereais, em detrimento da carne.
Tendo em conta estas regras de interdependência, não seria surpreendente se tudo acontecesse ao mesmo tempo.
QUE FAZER?
No tratamento duma doença, o diagnóstico dos sintomas é apenas uma primeira etapa. Pode a terapia contentar-se com o tratamento dos sintomas, sem correr o risco de recidivas crónicas? Ir à raiz dos males e identificar as suas causas profundas é a etapa que deveria seguir qualquer diagnóstico.
Relativamente à ameaça de penúria alimentar, antes de propor soluções aplicáveis à escala individual, uma outra questão se impõe: como é que chegámos aqui?
(...)
CONCLUSÃO SOBRE O RISCO DE PENÚRIA ALIMENTAR
O QUE É QUE PODERIA EVITAR QUE ELA ACONTEÇA?
Tendo em conta os factores que condicionam a baixa da produtividade, e aqueles que aceleram o aumento da procura, a questão que hoje se coloca, sobre a penúria alimentar, é saber se ainda a podemos evitar.
Para evitar uma crise alimentar generalizada, seriam necessárias mudanças que permitissem inverter radical e rapidamente todos os fenómenos anteriormente descritos. Isto é, mudar radical e rapidamente o regime alimentar e o modo de vida das populações ocidentais, modificando ao mesmo tempo os nossos métodos de cultura à escala do planeta.
Reconverter um campo de milho cultivado quimicamente, num campo de batatas, de nabos ou cenouras, não se faz dum dia para o outro. Mas a sensação de fome começa desde a primeira refeição aligeirada ou adiada.
Esperar que uma parte da população ocidental viva esta situação extrema, para iniciar as mudanças necessárias, expõe-nos a perigos graves. As consequências económicas, sociais e políticas seriam à medida da nossa teimosia, durante os decénios passados.
QUANDO É QUE ELA AMEAÇA CHEGAR?
A esta questão podemos responder que ela já está em curso, uma vez que um bilião de seres humanos vive todos os dias a sensação de fome.
No Ocidente, tem sido graças aos stocks dos anos passados que até agora temos escapado à crise alimentar. Estando os stocks mundiais em baixo, bastará um ano de colheitas calamitosas para que sejamos confrontados com ela. Inversamente, boas colheitas concedem-nos todos os anos um adiamento.
COMO É QUE A CRISE PODE SER DESENCADEADA?
Dois cenários são possíveis. O primeiro exclui qualquer acontecimento excepcional. Neste caso prosseguiriam as tendências de fundo, com repercussões mais ou menos marcadas sobre as colheitas, conforme os anos. As tensões sobre os mercados dos produtos agrícolas subiriam progressivamente. Seriam cada vez mais frequentes as situações críticas, e cada vez mais próximas de nós. A subida dos preços aconteceria lentamente, na continuidade do que conhecemos há alguns anos. Certos alimentos acabariam por faltar, depois outros, etc.
O segundo cenário tem em conta numerosos acontecimentos excepcionais, susceptíveis de acelerar as tendências em curso: fenómenos climáticos maiores, aparecimento de pestes vegetais, ou outras pragas resistentes aos tratamentos, falta de água, epizootias nos estábulos, etc. Neste cenário tudo pode alterar-se em apenas algumas semanas. A explosão dos preços seria então vertiginosa e brutal. A fome poderia afectar uma parte da população ocidental em muito pouco tempo. Estes acontecimentos mais não fariam do que revelar-nos brutalmente as consequências dos nossos actos passados.
INTERDEPENDÊNCIA
Interdependência e interacção são também princípios aplicáveis às causas acima descritas. Por exemplo, as faltas de água, as grandes amplitudes térmicas ou as chuvas fortes, têm sobre os rendimentos um impacto não só directo, mas também indirecto. Criam circunstâncias propícias ao desenvolvimento de doenças.
A interacção dos fenómenos aplica-se a uma escala global. Outros factores, aparentemente estranhos à actividade agrícola, podem desempenhar um papel maior na evolução das tendências em curso. A crise financeira, ou as tensões internacionais que perturbem as trocas comerciais, são apenas dois exemplos. Mais surpreendente ainda, uma pandemia mundial de gripe, suína ou aviária, teria impacto nos mercados sobre a procura: os consumidores voltar-se-iam certamente para os cereais, em detrimento da carne.
Tendo em conta estas regras de interdependência, não seria surpreendente se tudo acontecesse ao mesmo tempo.
QUE FAZER?
No tratamento duma doença, o diagnóstico dos sintomas é apenas uma primeira etapa. Pode a terapia contentar-se com o tratamento dos sintomas, sem correr o risco de recidivas crónicas? Ir à raiz dos males e identificar as suas causas profundas é a etapa que deveria seguir qualquer diagnóstico.
Relativamente à ameaça de penúria alimentar, antes de propor soluções aplicáveis à escala individual, uma outra questão se impõe: como é que chegámos aqui?
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terça-feira, 24 de agosto de 2010
Hora do folhetim - 34
(...)
A rota do norte diferia da rota do sul. Deixaram para trás as Pampas e a zona dos ventos de oeste. Agora tinham por diante as regiões florestais do norte da Argentina, onde não era fácil encontrar comida. Oitocentos quilómetros a oeste ficava o Pacífico e as suas praias, mas pelo meio elevava-se a cadeia montanhosa dos Andes. Chegaram à zona dos ventos alísios de sueste. Para terem vento de lado, teriam que voar para nordeste ou para oeste. Podiam escolher entre as infindáveis selvas do Brasil, nas quais, em 2500 quilómetros, quase não havia alimento nem lugar onde poisar, e as alturas dos Andes, com a sua atmosfera instável e rarefeita. O maçaricão dirigiu-se instintivamente para oeste.
Durante uma noite inteira voaram sobre contrafortes montanhosos cada vez mais altos. Hora após hora foram subindo, até as asas vibrarem de cansaço. De manhã poisaram num planalto coberto de erva densa. A terra ondeava sem fim diante deles, ondeava subindo, até onde a vista alcançava. O horizonte parecia uma folha de serra. Nuvens brancas e cumes nevados fundiam-se uns nos outros.
Logo que o sol mergulhou atrás dos Andes, os maçaricões reiniciaram o voo. Avançavam lenta e penosamente, uma vez que tinham de ir subindo sempre. O ar tornara-se mais rarefeito, oferecia menos sustentação às asas e menos oxigénio aos pulmões sobrecarregados. Eles eram aves de planície, e não possuíam os enormes pulmões que possibilitam a vida a cinco mil metros de altitude, como os lamas peludos e os seus pastores índios. Em breve ficaram cansados. Algumas horas antes do amanhecer poisaram, esgotados, na saliência duma falésia. Uma escassa camada de líquenes e musgos tinha-se agarrado à rocha. Descansaram o resto da noite encostados um ao outro, defendendo-se das rajadas do vento frio.
(...)
A rota do norte diferia da rota do sul. Deixaram para trás as Pampas e a zona dos ventos de oeste. Agora tinham por diante as regiões florestais do norte da Argentina, onde não era fácil encontrar comida. Oitocentos quilómetros a oeste ficava o Pacífico e as suas praias, mas pelo meio elevava-se a cadeia montanhosa dos Andes. Chegaram à zona dos ventos alísios de sueste. Para terem vento de lado, teriam que voar para nordeste ou para oeste. Podiam escolher entre as infindáveis selvas do Brasil, nas quais, em 2500 quilómetros, quase não havia alimento nem lugar onde poisar, e as alturas dos Andes, com a sua atmosfera instável e rarefeita. O maçaricão dirigiu-se instintivamente para oeste.
Durante uma noite inteira voaram sobre contrafortes montanhosos cada vez mais altos. Hora após hora foram subindo, até as asas vibrarem de cansaço. De manhã poisaram num planalto coberto de erva densa. A terra ondeava sem fim diante deles, ondeava subindo, até onde a vista alcançava. O horizonte parecia uma folha de serra. Nuvens brancas e cumes nevados fundiam-se uns nos outros.
Logo que o sol mergulhou atrás dos Andes, os maçaricões reiniciaram o voo. Avançavam lenta e penosamente, uma vez que tinham de ir subindo sempre. O ar tornara-se mais rarefeito, oferecia menos sustentação às asas e menos oxigénio aos pulmões sobrecarregados. Eles eram aves de planície, e não possuíam os enormes pulmões que possibilitam a vida a cinco mil metros de altitude, como os lamas peludos e os seus pastores índios. Em breve ficaram cansados. Algumas horas antes do amanhecer poisaram, esgotados, na saliência duma falésia. Uma escassa camada de líquenes e musgos tinha-se agarrado à rocha. Descansaram o resto da noite encostados um ao outro, defendendo-se das rajadas do vento frio.
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Planeta-Mãe - 23
(...)
A especulação bolsista
Ela antecipa, acelera e amplifica as tendências económicas que se perfilam. Se a ameaça de penúria alimentar se manifestar num contexto de crise económica, a especulação sobre os produtos agrícolas pode atingir a desmesura.
O que é que procuram os investidores? Um suporte seguro e rentável onde possam colocar o seu dinheiro. E qual é o seu objectivo? Fazer frutificar o capital, quer dizer, ganhar dinheiro com o seu dinheiro. Como fazer? Comprar, por exemplo, acções duma companhia que lhes traga dividendos. Sendo muito procuradas as acções de sociedades rentáveis e generosas em dividendos, o seu valor em bolsa aumenta. Este aumento de valor permite então criar mais-valias, em caso de revenda das acções. “Comprar em baixa e revender em alta” é a palavra de ordem.
Quando as perspectivas de rentabilidade das empresas se tornam sombrias, os investidores voltam-se para outros suportes de investimento, que não as acções. “O que é que posso comprar hoje no mercado, cujo valor tenha fortes possibilidades de aumentar amanhã?” A resposta é: aquilo que corre o risco de se tornar raro. É sabido que tudo o que é raro – e procurado - é caro.
O ouro, cujo valor está ligado à raridade do metal, é muitas vezes um refúgio. O seu valor aumenta significativamente em períodos de crise económica e financeira.
Ameaçados de escassez, os produtos agrícolas poderiam transformar-se em valor- refúgio. Os bens alimentares de base são hoje cotados em bolsa, num mercado mundializado. Os preços do trigo, do arroz, do milho, da soja, do açúcar… flutuam ao sabor da oferta e da procura. Quando a oferta baixa e a procura aumenta, os preços sobem.
Num contexto económico e financeiro em que todos os “papéis” se afundem, a especulação no mercado dos produtos agrícolas pode tomar proporções surrealistas. Tanto mais que estes produtos oferecem uma garantia infalível: mesmo no fundo duma crise económica, os seres humanos não deixam de comer.
Esta especulação permitiria uma vez mais a alguns afortunados registar substanciais mais-valias, sendo a consequência do seu enriquecimento a fome dos mais pobres e desprotegidos. E seria surpreendente que eles tivessem escrúpulos, porque os escrúpulos nunca foram um freio para o funcionamento do sistema capitalista.
Excluindo algumas excepções, como as indústrias de guerra, a redução da actividade económica segue a par com a redução dos efectivos nas empresas. O desemprego é o sintoma social duma escassez de trabalho. Os desempregados não só perdem o salário, mas também o moral. Os que temem a mesma sorte perdem a confiança e duvidam do futuro. Em tal estado de espírito, o momento não é de endividamento e consumo, mas de desendividamento e poupança. Isso abranda ainda mais o consumo, acentuando a recessão. E a crise social torna-se uma causa da crise económica.
(…)
A especulação bolsista
Ela antecipa, acelera e amplifica as tendências económicas que se perfilam. Se a ameaça de penúria alimentar se manifestar num contexto de crise económica, a especulação sobre os produtos agrícolas pode atingir a desmesura.
O que é que procuram os investidores? Um suporte seguro e rentável onde possam colocar o seu dinheiro. E qual é o seu objectivo? Fazer frutificar o capital, quer dizer, ganhar dinheiro com o seu dinheiro. Como fazer? Comprar, por exemplo, acções duma companhia que lhes traga dividendos. Sendo muito procuradas as acções de sociedades rentáveis e generosas em dividendos, o seu valor em bolsa aumenta. Este aumento de valor permite então criar mais-valias, em caso de revenda das acções. “Comprar em baixa e revender em alta” é a palavra de ordem.
Quando as perspectivas de rentabilidade das empresas se tornam sombrias, os investidores voltam-se para outros suportes de investimento, que não as acções. “O que é que posso comprar hoje no mercado, cujo valor tenha fortes possibilidades de aumentar amanhã?” A resposta é: aquilo que corre o risco de se tornar raro. É sabido que tudo o que é raro – e procurado - é caro.
O ouro, cujo valor está ligado à raridade do metal, é muitas vezes um refúgio. O seu valor aumenta significativamente em períodos de crise económica e financeira.
Ameaçados de escassez, os produtos agrícolas poderiam transformar-se em valor- refúgio. Os bens alimentares de base são hoje cotados em bolsa, num mercado mundializado. Os preços do trigo, do arroz, do milho, da soja, do açúcar… flutuam ao sabor da oferta e da procura. Quando a oferta baixa e a procura aumenta, os preços sobem.
Num contexto económico e financeiro em que todos os “papéis” se afundem, a especulação no mercado dos produtos agrícolas pode tomar proporções surrealistas. Tanto mais que estes produtos oferecem uma garantia infalível: mesmo no fundo duma crise económica, os seres humanos não deixam de comer.
Esta especulação permitiria uma vez mais a alguns afortunados registar substanciais mais-valias, sendo a consequência do seu enriquecimento a fome dos mais pobres e desprotegidos. E seria surpreendente que eles tivessem escrúpulos, porque os escrúpulos nunca foram um freio para o funcionamento do sistema capitalista.
Excluindo algumas excepções, como as indústrias de guerra, a redução da actividade económica segue a par com a redução dos efectivos nas empresas. O desemprego é o sintoma social duma escassez de trabalho. Os desempregados não só perdem o salário, mas também o moral. Os que temem a mesma sorte perdem a confiança e duvidam do futuro. Em tal estado de espírito, o momento não é de endividamento e consumo, mas de desendividamento e poupança. Isso abranda ainda mais o consumo, acentuando a recessão. E a crise social torna-se uma causa da crise económica.
(…)
terça-feira, 17 de agosto de 2010
Mexilhão de rio
É este o vilão que desertou da Ribeira de Tourões, e que a Rio Vivo pretende trazer de volta.
"As larvas permanecem fixas à guelras do salmão e da truta (diz-se que também da boga, do escalo, etc). Depois de várias metamorfoses, acaba por se soltar do hospedeiro. (...) Porém, a sua sobrevivência vai depender muito do local onde caia. Se for em zonas poluídas, terá poucas possibilidades de sobreviver. Mas se lhe tocarem em sorte águas de boa qualidade, poderá chegar aos 140 anos".
Terá sido a poluição da Ribeira de Tourões, antes da construção da ETAR de Vilar Formoso, que ditou o seu desaparecimento.
Dado como extinto em 1986, reapareceu nos últimos anos nos rios Cávado, Bessa, Rabaçal, Mente, Tuela, Neiva e Paiva.
Trazer o bicho de novo à ribeira não é tarefa fácil. Mas mais difícil é para quem não sonha.
domingo, 15 de agosto de 2010
Hora do folhetim - 33
(...)
Uma noite, quando um forte vento de oeste soprava sobre os montes junto à costa, voaram como habitualmente terra adentro. Mas desta vez o macho subiu nos ares mais alto do que era costume. Seguiu pelas Pampas adiante, e, quando a escuridão caíu, continuaram a voar. As etapas diárias que tinham percorrido eram curtas, e já não satisfaziam o impulso migratório cada vez mais urgente. Deixaram a costa para trás e voaram para noroeste, na direcção dos Andes. O macho sentiu diminuir a tensão, ao reconhecer, com a primeira noite de voo, que a migração tinha de facto começado.
Voaram durante seis horas e as asas fatigaram-se. Quando poisaram para descansar, era ainda muito escuro. Agora deslocavam-se pouco durante o dia. Mas, logo que o sol se punha, o maçaricão conduzia a fêmea para as alturas do céu e encaminhava-se sempre para noroeste. A cada noite as asas ganhavam força, e, uma semana depois, voaram desde o pôr do sol até à madrugada, sem poisar.
E assim continuaram, o macho sempre à frente e a fêmea um pouco atrás e ao lado, arrastada pelo turbilhão de ar, numa das pontas da asa. Na escuridão falavam continuamente um com o outro, enviavam-se pequenos sinais, um pouco mais fortes do que o rumor do vento cortado pelo voo. E o macho foi esquecendo lentamente a sua antiga solidão de sempre. Encontravam muitas tarambolas. Mas os dois bastavam-se a si próprios, e a sua relação preenchia-os tão completamente que nunca se juntaram a qualquer bando. A maior parte das vezes voavam sozinhos.
(...)
Uma noite, quando um forte vento de oeste soprava sobre os montes junto à costa, voaram como habitualmente terra adentro. Mas desta vez o macho subiu nos ares mais alto do que era costume. Seguiu pelas Pampas adiante, e, quando a escuridão caíu, continuaram a voar. As etapas diárias que tinham percorrido eram curtas, e já não satisfaziam o impulso migratório cada vez mais urgente. Deixaram a costa para trás e voaram para noroeste, na direcção dos Andes. O macho sentiu diminuir a tensão, ao reconhecer, com a primeira noite de voo, que a migração tinha de facto começado.
Voaram durante seis horas e as asas fatigaram-se. Quando poisaram para descansar, era ainda muito escuro. Agora deslocavam-se pouco durante o dia. Mas, logo que o sol se punha, o maçaricão conduzia a fêmea para as alturas do céu e encaminhava-se sempre para noroeste. A cada noite as asas ganhavam força, e, uma semana depois, voaram desde o pôr do sol até à madrugada, sem poisar.
E assim continuaram, o macho sempre à frente e a fêmea um pouco atrás e ao lado, arrastada pelo turbilhão de ar, numa das pontas da asa. Na escuridão falavam continuamente um com o outro, enviavam-se pequenos sinais, um pouco mais fortes do que o rumor do vento cortado pelo voo. E o macho foi esquecendo lentamente a sua antiga solidão de sempre. Encontravam muitas tarambolas. Mas os dois bastavam-se a si próprios, e a sua relação preenchia-os tão completamente que nunca se juntaram a qualquer bando. A maior parte das vezes voavam sozinhos.
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Planeta-Mãe - 22
(...)
Do liberalismo ao proteccionismo
No primeiro semestre de 2008, vários países entre os quais o Vietname, o Egipto, a Índia ou o Cazaquistão anunciaram a redução ou a supressão das suas exportações de cereais. Estas decisões políticas fizeram baixar a oferta nos mercados mundiais.
Tais decisões puseram em evidência os limites dum sistema baseado na livre troca à escala mundial. As noções de abertura e de partilha comum das riquezas não pesam muito numa situação difícil. Nos anos 30, que foram um período de grande depressão económica, o gesto “cada um por si” fez lei, mesmo à escala dos estados.
As relações internacionais foram então fortemente perturbadas por uma guerra comercial, a dos direitos aduaneiros. A corrente de pensamento ultra-liberal nasceu deste medo do proteccionismo. E o medo é mau conselheiro. Hoje são os limites e os excessos do liberalismo mundializado que fazem renascer as tendências proteccionistas.
A história mostra que os conflitos económicos e comerciais entre estados, quando tocam nos fundamentos da vida económica de cada país, quase sempre conduziram a conflitos armados. Saberemos nós escapar a estes extremos, se os litígios assentarem no acesso das populações aos recursos alimentares mundiais?
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Do liberalismo ao proteccionismo
No primeiro semestre de 2008, vários países entre os quais o Vietname, o Egipto, a Índia ou o Cazaquistão anunciaram a redução ou a supressão das suas exportações de cereais. Estas decisões políticas fizeram baixar a oferta nos mercados mundiais.
Tais decisões puseram em evidência os limites dum sistema baseado na livre troca à escala mundial. As noções de abertura e de partilha comum das riquezas não pesam muito numa situação difícil. Nos anos 30, que foram um período de grande depressão económica, o gesto “cada um por si” fez lei, mesmo à escala dos estados.
As relações internacionais foram então fortemente perturbadas por uma guerra comercial, a dos direitos aduaneiros. A corrente de pensamento ultra-liberal nasceu deste medo do proteccionismo. E o medo é mau conselheiro. Hoje são os limites e os excessos do liberalismo mundializado que fazem renascer as tendências proteccionistas.
A história mostra que os conflitos económicos e comerciais entre estados, quando tocam nos fundamentos da vida económica de cada país, quase sempre conduziram a conflitos armados. Saberemos nós escapar a estes extremos, se os litígios assentarem no acesso das populações aos recursos alimentares mundiais?
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sábado, 31 de julho de 2010
Hora do folhetim - 32
(...)
O macho alimentou a fêmea, apresentou-se como companheiro e a fêmea aceitou-o. E assim começou o jogo nupcial. Nenhum deles mostrara qualquer excitação exterior, qualquer alegria exibicionista. O macho deu o caracol à fêmea, esta recebeu-o, o casamento estava selado.
Agora cada um procurava alimento para si próprio, sem prestarem atenção um ao outro, embora se mantivessem próximos. E, como nunca antes, o macho sentia-se atraído pelo montão de pedras, junto à curva do rio, na tundra distante.
Quando chegou o crepúsculo levantou voo, circulou sobre a fêmea e chamou-a. Ela lançou-se para o ar, e juntos voaram para o interior, sobre as elevações que bordejavam a costa. Depois do escurecer poisaram numa encosta coberta de ervas e dormiram um junto do outro, os pescoços quase se tocando. O macho sentia-se renascer, uma outra vida tinha começado.
Ao romper do dia regressaram à praia. Depois voaram mais rapidamente para norte, cerca de quinze quilómetros em cada etapa. De vez em quando faziam pausas para comer, mas a tundra chamava cada vez mais fortemente. Cada dia que passava voavam mais longe e comiam menos do que na véspera.
No princípio de Fevereiro estavam já a 1600 quilómetros do ponto de partida. E como sempre, na sua viagem para norte, paravam nos charcos à beira-mar. Era primavera, e as gónadas produziam cada vez mais hormonas sexuais, que lentamente faziam crescer a sua excitação. Muitas vezes o macho interrompia bruscamente a busca de alimento, e pavoneava-se em frente da fêmea como um galo de combate, com a plumagem do pescoço tufada e as penas da cauda emplumadas em leque sobre o dorso. Aí a fêmea inclinava-se com as asas frementes, e pedia comida como se fosse um pintaínho. O macho oferecia-lhe um petisco, os seus bicos tocavam-se, e com isso terminava o jogo nupcial.
(...)
O macho alimentou a fêmea, apresentou-se como companheiro e a fêmea aceitou-o. E assim começou o jogo nupcial. Nenhum deles mostrara qualquer excitação exterior, qualquer alegria exibicionista. O macho deu o caracol à fêmea, esta recebeu-o, o casamento estava selado.
Agora cada um procurava alimento para si próprio, sem prestarem atenção um ao outro, embora se mantivessem próximos. E, como nunca antes, o macho sentia-se atraído pelo montão de pedras, junto à curva do rio, na tundra distante.
Quando chegou o crepúsculo levantou voo, circulou sobre a fêmea e chamou-a. Ela lançou-se para o ar, e juntos voaram para o interior, sobre as elevações que bordejavam a costa. Depois do escurecer poisaram numa encosta coberta de ervas e dormiram um junto do outro, os pescoços quase se tocando. O macho sentia-se renascer, uma outra vida tinha começado.
Ao romper do dia regressaram à praia. Depois voaram mais rapidamente para norte, cerca de quinze quilómetros em cada etapa. De vez em quando faziam pausas para comer, mas a tundra chamava cada vez mais fortemente. Cada dia que passava voavam mais longe e comiam menos do que na véspera.
No princípio de Fevereiro estavam já a 1600 quilómetros do ponto de partida. E como sempre, na sua viagem para norte, paravam nos charcos à beira-mar. Era primavera, e as gónadas produziam cada vez mais hormonas sexuais, que lentamente faziam crescer a sua excitação. Muitas vezes o macho interrompia bruscamente a busca de alimento, e pavoneava-se em frente da fêmea como um galo de combate, com a plumagem do pescoço tufada e as penas da cauda emplumadas em leque sobre o dorso. Aí a fêmea inclinava-se com as asas frementes, e pedia comida como se fosse um pintaínho. O macho oferecia-lhe um petisco, os seus bicos tocavam-se, e com isso terminava o jogo nupcial.
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Planeta-Mãe - 21
(...)
MODO DE VIDA E MODELO ECONÓMICO
Esta lista de fenómenos explicativos do aumento da procura nos mercados mundiais de alimentos não é exaustiva. Mais ainda do que as razões da baixa de produção, ela revela que as tendências em curso partilham com ela a mesma causa fundamental: o nosso modo de vida ocidental e as necessidades que daí decorrem.
Resolver o problema da fome no mundo, e evitar que um dia nos atinja, passa necessariamente por pôr em causa o nosso modo de vida, os nossos valores, o nosso modelo sócio-económico. Os números da fome no mundo, nas últimas décadas, acompanharam os números da obesidade nos países desenvolvidos. E muito antes de viver uma situação de penúria, a subida de preços dos produtos alimentares bem pode conhecer uma amplitude e uma brutalidade que temos hoje dificuldade em imaginar. Vários factores alimentam a volatilidade dos preços…
OUTROS FACTORES QUE INFLUENCIAM OS PREÇOS
Para além dos riscos de escassez, há outros parâmetros que pesam sobre os preços dos produtos alimentares nos mercados mundiais. Além do seu preço ligado ao modo de produção, os factores económicos e políticos são igualmente determinantes.
Uma agricultura dependente do petróleo
São necessárias 3 toneladas de petróleo para produzir uma tonelada de adubo azotado. São necessários 3 litros de petróleo para produzir uma salada cultivada em estufa aquecida. O mesmo para um quilo de tomate. Sete litros de petróleo são consumidos para obter um quilo de carne, etc.
Duma forma geral, a agricultura intensiva consome entre 5 e 10 kilojoules de energia-petróleo para produzir 3 kilojoules alimentares. Neste modo de produção, quando os preços da energia sobem, os dos alimentos seguem atrás.
A subida dos preços dos produtos alimentares, constatada desde o início dos anos 2000, estava em parte ligada a este fenómeno. Era a lei da oferta e da procura no mercado do petróleo que fazia subir os preços dos alimentos. A especulação em alta sobre o preço do barril de petróleo intensificou-se a partir do fim do ano de 2007, ao mesmo tempo que se aplicou às matérias-primas e aos produtos agrícolas.
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MODO DE VIDA E MODELO ECONÓMICO
Esta lista de fenómenos explicativos do aumento da procura nos mercados mundiais de alimentos não é exaustiva. Mais ainda do que as razões da baixa de produção, ela revela que as tendências em curso partilham com ela a mesma causa fundamental: o nosso modo de vida ocidental e as necessidades que daí decorrem.
Resolver o problema da fome no mundo, e evitar que um dia nos atinja, passa necessariamente por pôr em causa o nosso modo de vida, os nossos valores, o nosso modelo sócio-económico. Os números da fome no mundo, nas últimas décadas, acompanharam os números da obesidade nos países desenvolvidos. E muito antes de viver uma situação de penúria, a subida de preços dos produtos alimentares bem pode conhecer uma amplitude e uma brutalidade que temos hoje dificuldade em imaginar. Vários factores alimentam a volatilidade dos preços…
OUTROS FACTORES QUE INFLUENCIAM OS PREÇOS
Para além dos riscos de escassez, há outros parâmetros que pesam sobre os preços dos produtos alimentares nos mercados mundiais. Além do seu preço ligado ao modo de produção, os factores económicos e políticos são igualmente determinantes.
Uma agricultura dependente do petróleo
São necessárias 3 toneladas de petróleo para produzir uma tonelada de adubo azotado. São necessários 3 litros de petróleo para produzir uma salada cultivada em estufa aquecida. O mesmo para um quilo de tomate. Sete litros de petróleo são consumidos para obter um quilo de carne, etc.
Duma forma geral, a agricultura intensiva consome entre 5 e 10 kilojoules de energia-petróleo para produzir 3 kilojoules alimentares. Neste modo de produção, quando os preços da energia sobem, os dos alimentos seguem atrás.
A subida dos preços dos produtos alimentares, constatada desde o início dos anos 2000, estava em parte ligada a este fenómeno. Era a lei da oferta e da procura no mercado do petróleo que fazia subir os preços dos alimentos. A especulação em alta sobre o preço do barril de petróleo intensificou-se a partir do fim do ano de 2007, ao mesmo tempo que se aplicou às matérias-primas e aos produtos agrícolas.
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domingo, 25 de julho de 2010
Horta
Os bons ofícios da Junta de Freguesia permitiram limpar e desassorear a área circundante da horta da Associação.
Na vala desagua uma pequena linha de água, cuja boca é visível na imagem, e que em tempos de mais chuva agrava as tendências de encharcamento, provocado pela subida do nível do Rio Seco.
O trabalho feito facilita a drenagem e era indispensável. Pena só que alguma descoordenação não tenha permitido instalar desde já as manilhas no acesso ao portal, para a entrada de máquinas na horta. Mas elas hão-de vir.
Porque é preciso cortar aqueles fenos, ensaiar com eles os primeiros passos na compostagem, decruar o solo que há 20 anos anda cru, e ir preparando a terra para os trabalhos da primavera.
Para o ano a horta da Rio Vivo há-de produzir, há-de brindar-nos com as suas primícias. Com a sabedoria do Falcão, e a mão de obra que não faltará.
Na vala desagua uma pequena linha de água, cuja boca é visível na imagem, e que em tempos de mais chuva agrava as tendências de encharcamento, provocado pela subida do nível do Rio Seco.
O trabalho feito facilita a drenagem e era indispensável. Pena só que alguma descoordenação não tenha permitido instalar desde já as manilhas no acesso ao portal, para a entrada de máquinas na horta. Mas elas hão-de vir.
Porque é preciso cortar aqueles fenos, ensaiar com eles os primeiros passos na compostagem, decruar o solo que há 20 anos anda cru, e ir preparando a terra para os trabalhos da primavera.
Para o ano a horta da Rio Vivo há-de produzir, há-de brindar-nos com as suas primícias. Com a sabedoria do Falcão, e a mão de obra que não faltará.
sexta-feira, 23 de julho de 2010
Um mundo feito à mão-20
Vulcano era o ferreiro dos infernos e marido de Vénus.
E forjou o escudo mítico de Aquiles, o invencível de Troia que um calcanhar traiu.
A estes dois Vulcanos de S. Pedro, cabe apenas aguçar os ferros do próximo torneio.
[Os dois deuses são do horário de verão; ao horário de inverno correspondem Hefesto e Afrodite]
E forjou o escudo mítico de Aquiles, o invencível de Troia que um calcanhar traiu.
A estes dois Vulcanos de S. Pedro, cabe apenas aguçar os ferros do próximo torneio.
[Os dois deuses são do horário de verão; ao horário de inverno correspondem Hefesto e Afrodite]
segunda-feira, 19 de julho de 2010
Um mundo feito à mão-18
sexta-feira, 16 de julho de 2010
Às armas!
A primeira obrigação, a tarefa mais urgente de todos os sócios da RIO VIVO, caso possam estar presentes, é procederem à sua inscrição no 1º Congresso.
Podem fazê-lo por telefone (961 281 773/outro de que disponham) ou através do mail a.rio.vivo@gmail.com.
Não falo, obviamente, daqueles associados que já assumiram funções a desempenhar, porque esse facto os inscreve. É aos restantes que a coisa diz respeito.
Entenderão que toda a logística depende do número de presenças. É importante sabê-lo tão cedo quanto possível.
Dois sócios dois, já o fizeram, honra seja feita ao bom exemplo!
Quanto ao resto, entre amigos e fãs e curiosos, já se inscreveram catorze!
É o carro a andar à frente dos bois, imagem curiosa mas pouco edificante!
Podem fazê-lo por telefone (961 281 773/outro de que disponham) ou através do mail a.rio.vivo@gmail.com.
Não falo, obviamente, daqueles associados que já assumiram funções a desempenhar, porque esse facto os inscreve. É aos restantes que a coisa diz respeito.
Entenderão que toda a logística depende do número de presenças. É importante sabê-lo tão cedo quanto possível.
Dois sócios dois, já o fizeram, honra seja feita ao bom exemplo!
Quanto ao resto, entre amigos e fãs e curiosos, já se inscreveram catorze!
É o carro a andar à frente dos bois, imagem curiosa mas pouco edificante!
quinta-feira, 15 de julho de 2010
Hora do folhetim - 31
(...)
8
A chegada da fêmea foi um ponto culminante estranhamente pálido e desdramatizado, depois de uma vida de eterna espera. O maçaricão estava no meio de algumas tarambolas, junto à água, e procurava alimento. De repente a fêmea estava ali! Tinha poisado a menos de um metro de distância, e ele podia observar-lhe cada pena da plumagem. Chegara com mais nove tarambolas. Silenciosamente tinham-se deixado planar sem que ninguém as notasse, salvo uma tarambola que se mantinha alerta às aves de rapina, enquanto as outras comiam. A fêmea fechou vagarosamente as asas, num movimento mais gracioso que o das companheiras. E voltou para ele o longo bico recurvado.
Ela pulou então sobre as altas pernas esverdeadas, e um gorgeio suave saiu-lhe da garganta. Ele pôs-se também aos pulos e respondeu baixinho.
Reconheceram-se sem reflectir, num súbito processo intuitivo. O macho sabia que se tinha enganado muitas vezes, sabia que os maçaricões-norte-americanos, confusamente parecidos, passavam o inverno muito mais a norte, no mar das Caraíbas. Aqui, no sul profundo, ele só podia encontrar maçaricões da sua espécie. Este era mais pequeno do que os outros, e de um castanho mais claro, tal como ele próprio. Na verdade, os seus pensamentos eram fugidios e quase informes. Mas a voz, a atitude, os movimentos da outra ave, mais do que o seu aspecto, disseram-lhe imediatamente que a sua fêmea chegara.
Ele nunca tinha visto um companheiro da espécie, e a fêmea provavelmente também não. Ambos tinham procurado, na América do Norte e do Sul, sem saberem exactamente o quê. Mas, logo que o acaso os juntou, o instinto velho de gerações permitiu, sem qualquer dúvida, que se reconhecessem, uma vez que o maçaricão tinha sido uma das aves mais difundidas em toda a América.
Durante um minuto ficaram ali imóveis, espreitando-se e saltitando. O macho estava excitado de contentamento. Finalmente podia calar o seu desejo da fêmea, que durante a vida inteira fora surgindo e desaparecendo, sem nunca ter sido satisfeito. Um pequeno caracol rastejava à sua frente, na água baixa. O maçaricão partiu-lhe a casca com uma bicada, mas não o comeu. Com o pescoço esticado e a plumagem tufada pavoneava-se em frente da fêmea. Constrangido e algo desajeitado, chegou-se junto dela e ofereceu-lho. A fêmea, com as asas um pouco abertas e todo o corpo a tremer, aproximou-se dele. Picou o caracol e engoliu-o de imediato.
(...)
8
A chegada da fêmea foi um ponto culminante estranhamente pálido e desdramatizado, depois de uma vida de eterna espera. O maçaricão estava no meio de algumas tarambolas, junto à água, e procurava alimento. De repente a fêmea estava ali! Tinha poisado a menos de um metro de distância, e ele podia observar-lhe cada pena da plumagem. Chegara com mais nove tarambolas. Silenciosamente tinham-se deixado planar sem que ninguém as notasse, salvo uma tarambola que se mantinha alerta às aves de rapina, enquanto as outras comiam. A fêmea fechou vagarosamente as asas, num movimento mais gracioso que o das companheiras. E voltou para ele o longo bico recurvado.
Ela pulou então sobre as altas pernas esverdeadas, e um gorgeio suave saiu-lhe da garganta. Ele pôs-se também aos pulos e respondeu baixinho.
Reconheceram-se sem reflectir, num súbito processo intuitivo. O macho sabia que se tinha enganado muitas vezes, sabia que os maçaricões-norte-americanos, confusamente parecidos, passavam o inverno muito mais a norte, no mar das Caraíbas. Aqui, no sul profundo, ele só podia encontrar maçaricões da sua espécie. Este era mais pequeno do que os outros, e de um castanho mais claro, tal como ele próprio. Na verdade, os seus pensamentos eram fugidios e quase informes. Mas a voz, a atitude, os movimentos da outra ave, mais do que o seu aspecto, disseram-lhe imediatamente que a sua fêmea chegara.
Ele nunca tinha visto um companheiro da espécie, e a fêmea provavelmente também não. Ambos tinham procurado, na América do Norte e do Sul, sem saberem exactamente o quê. Mas, logo que o acaso os juntou, o instinto velho de gerações permitiu, sem qualquer dúvida, que se reconhecessem, uma vez que o maçaricão tinha sido uma das aves mais difundidas em toda a América.
Durante um minuto ficaram ali imóveis, espreitando-se e saltitando. O macho estava excitado de contentamento. Finalmente podia calar o seu desejo da fêmea, que durante a vida inteira fora surgindo e desaparecendo, sem nunca ter sido satisfeito. Um pequeno caracol rastejava à sua frente, na água baixa. O maçaricão partiu-lhe a casca com uma bicada, mas não o comeu. Com o pescoço esticado e a plumagem tufada pavoneava-se em frente da fêmea. Constrangido e algo desajeitado, chegou-se junto dela e ofereceu-lho. A fêmea, com as asas um pouco abertas e todo o corpo a tremer, aproximou-se dele. Picou o caracol e engoliu-o de imediato.
(...)
Planeta-Mãe - 20
(...)
O AUMENTO DA POPULAÇÃO MUNDIAL
Um relatório da FAO evidenciou em 2007 que o desenvolvimento da agricultura tradicional permitiria alimentar, em quantidade e qualidade, toda a população planetária. Além do mais, esta reconversão daria trabalho a milhões de pessoas, hoje desocupadas e miseráveis.
Dar às populações os meios para reconquistarem a soberania alimentar, traria às pessoas um elemento essencial que elas não podem encontrar enquanto dependentes da caridade mundial: a sua dignidade.
No quadro dum regime alimentar adaptado, usando técnicas de cultura agro-ecológicas, uma família de 4 pessoas pode ser auto-suficiente alimentarmente com um hectare de terra arável. Isso representa um quarto de hectare por habitante, havendo 2,3 à escala planetária. Temos 30 milhões de hectares de terra arável em França, o que perfaz meio hectare por habitante.
Do ponto de vista da natureza, se ela tivesse que fazer justiça pelas suas próprias mãos, começaria por erradicar os 20% de humanos responsáveis por 80% das destruições, pilhagens e poluições: NÓS, que nos permitimos afirmar que “somos demasiado numerosos”.
O AUMENTO DA POPULAÇÃO MUNDIAL
Um relatório da FAO evidenciou em 2007 que o desenvolvimento da agricultura tradicional permitiria alimentar, em quantidade e qualidade, toda a população planetária. Além do mais, esta reconversão daria trabalho a milhões de pessoas, hoje desocupadas e miseráveis.
Dar às populações os meios para reconquistarem a soberania alimentar, traria às pessoas um elemento essencial que elas não podem encontrar enquanto dependentes da caridade mundial: a sua dignidade.
No quadro dum regime alimentar adaptado, usando técnicas de cultura agro-ecológicas, uma família de 4 pessoas pode ser auto-suficiente alimentarmente com um hectare de terra arável. Isso representa um quarto de hectare por habitante, havendo 2,3 à escala planetária. Temos 30 milhões de hectares de terra arável em França, o que perfaz meio hectare por habitante.
Do ponto de vista da natureza, se ela tivesse que fazer justiça pelas suas próprias mãos, começaria por erradicar os 20% de humanos responsáveis por 80% das destruições, pilhagens e poluições: NÓS, que nos permitimos afirmar que “somos demasiado numerosos”.
sábado, 10 de julho de 2010
quarta-feira, 7 de julho de 2010
1º Congresso da Associação RIO VIVO
Tema: “À descoberta das nascentes”
Data: 7 e 8 de Agosto de 2010
Local: Pavilhão Multiusos de S. Pedro do Rio Seco
Programa
Primeiro dia: Sábado, dia 7 de Agosto
10.00: Recepção dos congressistas
10.30: Sessão de abertura
11.00: Palestra de abertura: Jorge Carvalheira
11.30: Pausa para café
11.45: A fauna e a flora da zona raiana: Amândio Caldeira
12.15: A solidariedade na terceira idade em zonas envelhecidas: Manuel Alcino Fernandes
12.45: Debate e encerramento
Almoço. “Buffet”a cargo da Associação
15.00: A história de S. Pedro do Rio Seco: José da Fonseca Ramos
15.30: Algumas tradições das fainas do campo: António André
16.00: Pausa para café
16.30: O que é a “transição”: Maria José Dinis da Fonseca, Presidente da ASTA
17.00: A experiência do Prémio Riba-Côa 2009: Filipe Vilhena
17.30: Debate e encerramento
20.00: Sardinhada e festa popular com concertina/acordeão.
Segundo dia: Domingo, dia 8 de Agosto
09:30: Passeio ao campo com visita às sepulturas na rocha
09.30: Início do percurso de BTT: Rota dos passadores
10.30:Torneio do Jogo do Ferro, com prémios aliciantes
13.00: Almoço sujeito a inscrição prévia (10,00 €)
15.00: Exposição de Fotografia: S. Pedro do Rio Seco de outros tempos
17.00: Recepção e boas-vindas a entidades
17.30: Palestra: Tempos de Mudança: Luís Queirós, presidente da Associação
18.00: Encerramento com actuação do Coro de Almeida
Contactos e inscrições
Inscrições a enviar para: a.rio.vio@gmail.com
Ou para Associação Rio Vivo – Casa do Quartel
6355-160 S. Pedro do Rio Seco
Pf. Indicar:
• Nome
• E-mail
• Telefone
• Inscrição para almoço do dia 8, se desejado
Preço das inscrições no congresso:
• Naturais de S. Pedro e familiares: grátis
• Associados Rio Vivo: grátis
• Assinantes do “Alto da Raia”: grátis
• Fãs do “Rio Vivo” no FaceBook: grátis
• Restantes congressistas: 5 Euros, a pagar no local
Data: 7 e 8 de Agosto de 2010
Local: Pavilhão Multiusos de S. Pedro do Rio Seco
Programa
Primeiro dia: Sábado, dia 7 de Agosto
10.00: Recepção dos congressistas
10.30: Sessão de abertura
11.00: Palestra de abertura: Jorge Carvalheira
11.30: Pausa para café
11.45: A fauna e a flora da zona raiana: Amândio Caldeira
12.15: A solidariedade na terceira idade em zonas envelhecidas: Manuel Alcino Fernandes
12.45: Debate e encerramento
Almoço. “Buffet”a cargo da Associação
15.00: A história de S. Pedro do Rio Seco: José da Fonseca Ramos
15.30: Algumas tradições das fainas do campo: António André
16.00: Pausa para café
16.30: O que é a “transição”: Maria José Dinis da Fonseca, Presidente da ASTA
17.00: A experiência do Prémio Riba-Côa 2009: Filipe Vilhena
17.30: Debate e encerramento
20.00: Sardinhada e festa popular com concertina/acordeão.
Segundo dia: Domingo, dia 8 de Agosto
09:30: Passeio ao campo com visita às sepulturas na rocha
09.30: Início do percurso de BTT: Rota dos passadores
10.30:Torneio do Jogo do Ferro, com prémios aliciantes
13.00: Almoço sujeito a inscrição prévia (10,00 €)
15.00: Exposição de Fotografia: S. Pedro do Rio Seco de outros tempos
17.00: Recepção e boas-vindas a entidades
17.30: Palestra: Tempos de Mudança: Luís Queirós, presidente da Associação
18.00: Encerramento com actuação do Coro de Almeida
Contactos e inscrições
Inscrições a enviar para: a.rio.vio@gmail.com
Ou para Associação Rio Vivo – Casa do Quartel
6355-160 S. Pedro do Rio Seco
Pf. Indicar:
• Nome
• Telefone
• Inscrição para almoço do dia 8, se desejado
Preço das inscrições no congresso:
• Naturais de S. Pedro e familiares: grátis
• Associados Rio Vivo: grátis
• Assinantes do “Alto da Raia”: grátis
• Fãs do “Rio Vivo” no FaceBook: grátis
• Restantes congressistas: 5 Euros, a pagar no local
quinta-feira, 1 de julho de 2010
Hora do folhetim - 30
(...)
E o maçaricão pôs-se a caminho de casa. Seguia de charco em charco e não fazia grandes trajectos. A indecisão tinha passado. Voava sempre para o norte. Também as outras narcejas sentiam o mesmo, estavam sempre em movimento. O número e a espécie das aves nos charcos mudava de hora a hora. Uma semana depois o maçaricão encontrava-se a trezentos quilómetros mais a norte.
O CORREDOR DA MORTE
Em anexo ao relatório anual do Instituto Smithsoniano, deve acrescentar-se algo sobre determinadas descobertas científicas. As participações vêm de colaboradores da casa...
O maçaricão-esquimó e o seu desaparecimento (reedição, revista pelo autor, Myron H. Swenk, dos debates da Sociedade Ornitológica do Nebraska, de 27 de Fevereiro de 1915).
Todos os ornitólogos informados concordam entretanto que o maçaricão-esquimó (Numenius borealis) está ameaçado de extinção. Muitos acreditam mesmo que as poucas aves que ainda existem não são suficientes para a renovação dos efectivos. Consideram-no como uma espécie que pertence praticamente ao passado. Se partirmos de situações análogas, parece legítimo este pessimismo. Talvez a história do maçaricão-esquimó, parecida com a do pombo-torcaz, constitua mais uma daquelas tragédias ornitológicas que sucederam na segunda metade do séc. XIX. Devido aos abates incontrolados e irracionais, reduziram-se os efectivos norte-americanos de aves. Várias espécies largamente difundidas, como se vê pelos gigantescos bandos, foram quase, se não totalmente, aniquiladas...
A comissão de defesa das aves submete à reunião ordinária de membros da Liga Ornitológica Americana os resultados da sua pesquisa no ano de 1939, relativos à destruição, ou antes, à conservação do mundo ornitológico nacional...
Mas particularmente ameaçados estão, sem dúvida, o condor californiano, o maçaricão-esquimó e o bico-de-marfim. Os efectivos reduziram-se tão drásticamente que os indivíduos sobreviventes se mantêm separados uns dos outros. Facto que, por sua vez, põe em causa a reprodução...
E o maçaricão pôs-se a caminho de casa. Seguia de charco em charco e não fazia grandes trajectos. A indecisão tinha passado. Voava sempre para o norte. Também as outras narcejas sentiam o mesmo, estavam sempre em movimento. O número e a espécie das aves nos charcos mudava de hora a hora. Uma semana depois o maçaricão encontrava-se a trezentos quilómetros mais a norte.
O CORREDOR DA MORTE
Em anexo ao relatório anual do Instituto Smithsoniano, deve acrescentar-se algo sobre determinadas descobertas científicas. As participações vêm de colaboradores da casa...
O maçaricão-esquimó e o seu desaparecimento (reedição, revista pelo autor, Myron H. Swenk, dos debates da Sociedade Ornitológica do Nebraska, de 27 de Fevereiro de 1915).
Todos os ornitólogos informados concordam entretanto que o maçaricão-esquimó (Numenius borealis) está ameaçado de extinção. Muitos acreditam mesmo que as poucas aves que ainda existem não são suficientes para a renovação dos efectivos. Consideram-no como uma espécie que pertence praticamente ao passado. Se partirmos de situações análogas, parece legítimo este pessimismo. Talvez a história do maçaricão-esquimó, parecida com a do pombo-torcaz, constitua mais uma daquelas tragédias ornitológicas que sucederam na segunda metade do séc. XIX. Devido aos abates incontrolados e irracionais, reduziram-se os efectivos norte-americanos de aves. Várias espécies largamente difundidas, como se vê pelos gigantescos bandos, foram quase, se não totalmente, aniquiladas...
A comissão de defesa das aves submete à reunião ordinária de membros da Liga Ornitológica Americana os resultados da sua pesquisa no ano de 1939, relativos à destruição, ou antes, à conservação do mundo ornitológico nacional...
Mas particularmente ameaçados estão, sem dúvida, o condor californiano, o maçaricão-esquimó e o bico-de-marfim. Os efectivos reduziram-se tão drásticamente que os indivíduos sobreviventes se mantêm separados uns dos outros. Facto que, por sua vez, põe em causa a reprodução...
segunda-feira, 28 de junho de 2010
1º Congresso
A 7 e 8 de Agosto, terá lugar em S. Pedro do Rio Seco o 1º Congresso da Rio Vivo.
Em antecipação ao programa detalhado, a divulgar oportunamente, do congresso farão parte:
- oito palestras sobre temas como "comunidades de transição", história local, tradições populares locais, fauna e flora local, a solidariedade social em comunidades envelhecidas, a agricultura moderna intensiva e a questão alimentar, o primeiro prémio Riba-Côa, o mundo em mudança;
- percurso BTT na manhã do dia 8;
- passeio pedestre simultâneo;
- torneio do jogo do ferro, com prémios para jovens, adultos e seniores;
- exposição de fotografia antiga;
- sardinhada com animação musical no sábado à noite;
- sessão de encerramento pelas 17 horas de domingo, com breve actuação do Coro de Almeida.
- almoço no dia 8, domingo, mediante inscrição e custo de 10 Euros. ( O almoço do dia 7, sábado, é volante e gracioso).
Por forma a facilitar toda a preparação logística, o primeiro e mais urgente gesto dos sócios, dos amigos e demais interessados no evento, é a inscrição como participante no Congresso. Deverá indicar-se nome, morada, telefone, endereço e-mail e inscrição no almoço de domingo, se pretendida.
Isso poderá ser feito para qualquer dos seguintes endereços e-mail:
a.rio.vivo@gmail.com
jcarvalheira@netcabo.pt
jorgcarvalheira@netcabo.pt
j_s_carvalheira@hotmail.com
Em antecipação ao programa detalhado, a divulgar oportunamente, do congresso farão parte:
- oito palestras sobre temas como "comunidades de transição", história local, tradições populares locais, fauna e flora local, a solidariedade social em comunidades envelhecidas, a agricultura moderna intensiva e a questão alimentar, o primeiro prémio Riba-Côa, o mundo em mudança;
- percurso BTT na manhã do dia 8;
- passeio pedestre simultâneo;
- torneio do jogo do ferro, com prémios para jovens, adultos e seniores;
- exposição de fotografia antiga;
- sardinhada com animação musical no sábado à noite;
- sessão de encerramento pelas 17 horas de domingo, com breve actuação do Coro de Almeida.
- almoço no dia 8, domingo, mediante inscrição e custo de 10 Euros. ( O almoço do dia 7, sábado, é volante e gracioso).
Por forma a facilitar toda a preparação logística, o primeiro e mais urgente gesto dos sócios, dos amigos e demais interessados no evento, é a inscrição como participante no Congresso. Deverá indicar-se nome, morada, telefone, endereço e-mail e inscrição no almoço de domingo, se pretendida.
Isso poderá ser feito para qualquer dos seguintes endereços e-mail:
a.rio.vivo@gmail.com
jcarvalheira@netcabo.pt
jorgcarvalheira@netcabo.pt
j_s_carvalheira@hotmail.com
sábado, 26 de junho de 2010
Hora do folhetim - 29
(...)
Na Patagónia já não havia solo fértil, como nas Pampas. O terreno era composto sobretudo de saibro e cascalho, misturado com rochas vulcânicas de pontas aguçadas. A vegetação era diminuta, e o sol mordente do verão tinha tingido de castanho as escassas manchas de capim e de cardos. As tarambolas abandonaram esta região inóspita e voaram para leste, à procura dos charcos da costa, frescos e cheios de alimento.
Aqui verifica-se um dos maiores desníveis de maré do mundo, e por isso, na maré baixa, quilómetros de solo ficam a descoberto. Duas vezes por dia o mar arroja para terra todo o tipo de despojos. Alimento nunca falta, e enormes bandos procuram estes baixios. A maior parte são tarambolas-douradas, mas também há pernas-amarelas, com os seus torsos luminosamente claros. As galinholas e os pequenos pilritos evitam, pressurosos, a rebentação, como se tivessem medo de molhar os pés.
O maçaricão vagueava de bando em bando, procurava incansavelmente, sem saber exactamente o quê. Com o seu longo bico encurvado e a grande envergadura de asas, sobressaía claramente entre os milhares de pequenas narcejas.
Janeiro chegara, e a longínqua tundra canadiana, a catorze mil e quinhentos quilómetros de distância, seria ainda durante alguns meses a adormecida terra fria das tempestades de neve e das noites sem fim. Mas o maçaricão sentia já o chamamento do Árctico, uma suave emoção interior, um sinal. As suas gónadas em breve começariam a produzir hormonas, um novo ciclo anual aproximava-se. A princípio era quase imperceptível, mas o processo foi-se tornando lentamente mais forte. Era um sentimento que se distinguia do impulso migratório do outono. Partir para o sul tinha sido uma vaga impaciência, sem fim definido. Mas agora só o objectivo contava. A migração era um fenómeno acidental e acessório. O que ele sentia era essencialmente a ânsia, a saudade de casa. Conhecia perfeitamente o destino, não só o Árctico e a tundra, mas o amontoado de cascalho, à beira da curva do rio. Aí havia de chegar também a fêmea, aí havia de ser o ninho.
(...)
Na Patagónia já não havia solo fértil, como nas Pampas. O terreno era composto sobretudo de saibro e cascalho, misturado com rochas vulcânicas de pontas aguçadas. A vegetação era diminuta, e o sol mordente do verão tinha tingido de castanho as escassas manchas de capim e de cardos. As tarambolas abandonaram esta região inóspita e voaram para leste, à procura dos charcos da costa, frescos e cheios de alimento.
Aqui verifica-se um dos maiores desníveis de maré do mundo, e por isso, na maré baixa, quilómetros de solo ficam a descoberto. Duas vezes por dia o mar arroja para terra todo o tipo de despojos. Alimento nunca falta, e enormes bandos procuram estes baixios. A maior parte são tarambolas-douradas, mas também há pernas-amarelas, com os seus torsos luminosamente claros. As galinholas e os pequenos pilritos evitam, pressurosos, a rebentação, como se tivessem medo de molhar os pés.
O maçaricão vagueava de bando em bando, procurava incansavelmente, sem saber exactamente o quê. Com o seu longo bico encurvado e a grande envergadura de asas, sobressaía claramente entre os milhares de pequenas narcejas.
Janeiro chegara, e a longínqua tundra canadiana, a catorze mil e quinhentos quilómetros de distância, seria ainda durante alguns meses a adormecida terra fria das tempestades de neve e das noites sem fim. Mas o maçaricão sentia já o chamamento do Árctico, uma suave emoção interior, um sinal. As suas gónadas em breve começariam a produzir hormonas, um novo ciclo anual aproximava-se. A princípio era quase imperceptível, mas o processo foi-se tornando lentamente mais forte. Era um sentimento que se distinguia do impulso migratório do outono. Partir para o sul tinha sido uma vaga impaciência, sem fim definido. Mas agora só o objectivo contava. A migração era um fenómeno acidental e acessório. O que ele sentia era essencialmente a ânsia, a saudade de casa. Conhecia perfeitamente o destino, não só o Árctico e a tundra, mas o amontoado de cascalho, à beira da curva do rio. Aí havia de chegar também a fêmea, aí havia de ser o ninho.
(...)
American way of life
Planeta-Mãe - 19
(...)
OS AGRO-COMBUSTÍVEIS
São combustíveis líquidos cuja primeira geração é fabricada a partir da colza, do trigo, do milho e da cana de açúcar, e em medida menor de óleos de cozinha e outras gorduras. Misturados à gasolina e ao gasóleo, permitem reduzir o consumo de petróleo.
A segunda geração de agro-combustíveis… não existe. Só existem hipóteses por confirmar, o que levará muitos anos. Entretanto tais hipóteses permitem amortizar os biliões investidos precipitadamente na construção de fábricas de “carburantes verdes” e de “bio-etanol”.
Seja qual for a sua geração, os agro-combustíveis são extraídos de vegetais cultivados em terras agrícolas. Isto quando um bilião de pessoas padece de fome e mal-nutrição.
O Brasil já consagra 15% da superfície cultivada à produção industrial de etanol com base na cana de açúcar. Estão em curso vários projectos de extensão desta actividade, havendo ainda disponíveis milhões de hectares cobertos de floresta. A procura mundial faz desta cultura um mercado prometedor.
Em Janeiro de 2007, Bush manifestou o desejo de que estes combustíveis representassem 15% do consumo de carburantes nos Estados Unidos até 2012. Quantos milhões de hectares de terra arável é que isso significa, tendo em conta o volume de petróleo consumido anualmente pelos americanos? Para encher o depósito duma viatura 4X4 com etanol puro, são precisos mais de 200 Kg de milho, ou seja, calorias bastantes para alimentar uma pessoa durante um ano.
A França tem como objectivo atingir os 10% até à mesma data. Porquê? Para respeitar a nossa quota de emissões de CO2. Porque é preciso ter boas razões, aos olhos da opinião pública, para poder ser ignóbil. A ecologia é o tapa-buracos do marketing político.
Ficam por encontrar os milhões de hectares de terras aráveis necessárias a essa cultura, num contexto em que as superfícies férteis se reduzem. As multinacionais preparam-se para comprar milhões de hectares de floresta primária no Brasil e na Indonésia, para plantar cana de açúcar e palma, cuja produção se tornará combustível. Mas tendo em conta a dependência energética da agricultura e dos processos industriais necessários para transformar os cereais em carburante, é preciso o equivalente energético de 1,2 a 1,5 litros de petróleo, para produzir um litro de bio-etanol.
E quanto às suas necessidades de água? Seca e poluição dos lençóis freáticos, erosão dos solos, alterações climáticas… todos os fenómenos já descritos não podem senão acelerar e amplificar-se.
Segundo um estudo do Banco Mundial, entre 2002 e 2008, a produção e utilização de agro-carburantes contribuíram para o aumento de 75% do preço dos produtos alimentares. Até então, o governo americano afirmava que eles não contribuíam com mais de 3%.
Os alimentos e a água serão em breve mais caros e mais raros do que o ouro negro. E se deixássemos a viatura na garagem e cultivássemos uma horta?
(...)
OS AGRO-COMBUSTÍVEIS
São combustíveis líquidos cuja primeira geração é fabricada a partir da colza, do trigo, do milho e da cana de açúcar, e em medida menor de óleos de cozinha e outras gorduras. Misturados à gasolina e ao gasóleo, permitem reduzir o consumo de petróleo.
A segunda geração de agro-combustíveis… não existe. Só existem hipóteses por confirmar, o que levará muitos anos. Entretanto tais hipóteses permitem amortizar os biliões investidos precipitadamente na construção de fábricas de “carburantes verdes” e de “bio-etanol”.
Seja qual for a sua geração, os agro-combustíveis são extraídos de vegetais cultivados em terras agrícolas. Isto quando um bilião de pessoas padece de fome e mal-nutrição.
O Brasil já consagra 15% da superfície cultivada à produção industrial de etanol com base na cana de açúcar. Estão em curso vários projectos de extensão desta actividade, havendo ainda disponíveis milhões de hectares cobertos de floresta. A procura mundial faz desta cultura um mercado prometedor.
Em Janeiro de 2007, Bush manifestou o desejo de que estes combustíveis representassem 15% do consumo de carburantes nos Estados Unidos até 2012. Quantos milhões de hectares de terra arável é que isso significa, tendo em conta o volume de petróleo consumido anualmente pelos americanos? Para encher o depósito duma viatura 4X4 com etanol puro, são precisos mais de 200 Kg de milho, ou seja, calorias bastantes para alimentar uma pessoa durante um ano.
A França tem como objectivo atingir os 10% até à mesma data. Porquê? Para respeitar a nossa quota de emissões de CO2. Porque é preciso ter boas razões, aos olhos da opinião pública, para poder ser ignóbil. A ecologia é o tapa-buracos do marketing político.
Ficam por encontrar os milhões de hectares de terras aráveis necessárias a essa cultura, num contexto em que as superfícies férteis se reduzem. As multinacionais preparam-se para comprar milhões de hectares de floresta primária no Brasil e na Indonésia, para plantar cana de açúcar e palma, cuja produção se tornará combustível. Mas tendo em conta a dependência energética da agricultura e dos processos industriais necessários para transformar os cereais em carburante, é preciso o equivalente energético de 1,2 a 1,5 litros de petróleo, para produzir um litro de bio-etanol.
E quanto às suas necessidades de água? Seca e poluição dos lençóis freáticos, erosão dos solos, alterações climáticas… todos os fenómenos já descritos não podem senão acelerar e amplificar-se.
Segundo um estudo do Banco Mundial, entre 2002 e 2008, a produção e utilização de agro-carburantes contribuíram para o aumento de 75% do preço dos produtos alimentares. Até então, o governo americano afirmava que eles não contribuíam com mais de 3%.
Os alimentos e a água serão em breve mais caros e mais raros do que o ouro negro. E se deixássemos a viatura na garagem e cultivássemos uma horta?
(...)
sexta-feira, 25 de junho de 2010
Um mundo feito à mão-18
Na Cabreira do Côa, fui dar com os companheiros da ASTA a festejar o S. João e a saltar a fogueira de rosmaninho. E dei comigo a pensar que vida seria a deles, se a ASTA não existisse. Se não houvesse este mundo feito à mão.
quinta-feira, 17 de junho de 2010
Hora do folhetim - 28
(...)
Assim foram avançando para sul. Quando o sol quente de Dezembro secou os cardos, e a erva das Pampas ficou da cor da prata devido à quantidade de flores que baloiçavam, ligeiras, ao vento, eles encontravam-se já nas planuras ondulantes da Patagónia, a uma noite de voo dos mares da Antárctida. Com uma força hercúlea, o instinto migratório tinha-os empurrado desde o longínquo norte até ao lugar mais a sul do continente americano. E também aqui havia grandes bandos de narcejas. De todos os animais da terra, só a andorinha-do-mar-árctica, voando distâncias semelhantes, pode contemplar tanta luz e tanto sol como as narcejas. Ano após ano, elas correm acima e abaixo, entre as terras do sol da meia-noite, quase de polo a polo.
Durante cinco meses um impulso insaciável tinha espicaçado o maçaricão e as tarambolas. Temporariamente enfraquecera, sem nunca ter desaparecido. Mas agora morria. Uma estranha letargia apoderava-se das tarambolas. Bastava-lhes alternar entre duas lagoas salgadas. Comiam, devaneavam, flanavam sem gosto por ali, como actores que se haviam esquecido do texto e esperavam por uma deixa, por um impulso instintivo que lhes dissesse o que deviam fazer.
O próprio maçaricão estava livre da pressão do impulso migratório. E no entanto atormentava-o um desassossego, uma antiga e indizível fome, uma velha solidão. Ocorreu-lhe de súbito que estava sozinho, num mundo onde não tinha companheiros de espécie. Tentou levar as tarambolas a continuar a migração, mas elas não o seguiram. Finalmente não pôde mais controlar a inquietude. Elevou-se no ar e alargou os seus círculos sobre a lagoa onde as tarambolas esgaravatavam alimento. Chamou-as repetidamente em altos gritos, mas elas não responderam. Então o maçaricão tomou a direcção do leste, lá onde estava o mar, bem o sabia, à distância de muitas horas de voo. Estava de novo em viagem, e sozinho.
(...)
Assim foram avançando para sul. Quando o sol quente de Dezembro secou os cardos, e a erva das Pampas ficou da cor da prata devido à quantidade de flores que baloiçavam, ligeiras, ao vento, eles encontravam-se já nas planuras ondulantes da Patagónia, a uma noite de voo dos mares da Antárctida. Com uma força hercúlea, o instinto migratório tinha-os empurrado desde o longínquo norte até ao lugar mais a sul do continente americano. E também aqui havia grandes bandos de narcejas. De todos os animais da terra, só a andorinha-do-mar-árctica, voando distâncias semelhantes, pode contemplar tanta luz e tanto sol como as narcejas. Ano após ano, elas correm acima e abaixo, entre as terras do sol da meia-noite, quase de polo a polo.
Durante cinco meses um impulso insaciável tinha espicaçado o maçaricão e as tarambolas. Temporariamente enfraquecera, sem nunca ter desaparecido. Mas agora morria. Uma estranha letargia apoderava-se das tarambolas. Bastava-lhes alternar entre duas lagoas salgadas. Comiam, devaneavam, flanavam sem gosto por ali, como actores que se haviam esquecido do texto e esperavam por uma deixa, por um impulso instintivo que lhes dissesse o que deviam fazer.
O próprio maçaricão estava livre da pressão do impulso migratório. E no entanto atormentava-o um desassossego, uma antiga e indizível fome, uma velha solidão. Ocorreu-lhe de súbito que estava sozinho, num mundo onde não tinha companheiros de espécie. Tentou levar as tarambolas a continuar a migração, mas elas não o seguiram. Finalmente não pôde mais controlar a inquietude. Elevou-se no ar e alargou os seus círculos sobre a lagoa onde as tarambolas esgaravatavam alimento. Chamou-as repetidamente em altos gritos, mas elas não responderam. Então o maçaricão tomou a direcção do leste, lá onde estava o mar, bem o sabia, à distância de muitas horas de voo. Estava de novo em viagem, e sozinho.
(...)
Planeta-Mãe - 18
(...)
A DOENÇA DAS VACAS LOUCAS
A Europa e a França são há muito tempo deficitárias na produção de cereais proteaginosos, embora estas plantas ricas em proteínas permitam uma engorda rápida dos animais. Mesmo fortemente subsidiadas e cobrindo 70% da superfície agrícola, as colheitas não bastam para cobrir as necessidades das criações intensivas de gado.
De facto nós nunca tivemos meios para comer carne como comemos. Durante anos alimentámos o gado com farinhas animais saídas do açougue. E foi preciso que as vacas ficassem loucas para darmos conta de que elas se tinham tornado carnívoras. Foi preciso o escândalo do frango com dioxinas, para descobrirmos que dávamos aos frangos a comer fosse o que fosse, incluindo lamas residuais da estação de tratamento.
Estas contrariedades obrigaram os produtores a voltarem-se para o mercado de cereais, fazendo aumentar a procura. Aumentaram as importações de forragem animal, 60% das quais provêm de países em vias de desenvolvimento. Pomos as suas populações pobres a cultivar soja, milho ou colza, destinados a engordar o nosso gado. Mas a maior parte delas continua a sofrer a fome e a malnutrição.
Outro escândalo ligado a estas importações é o facto de que elas introduziram os Organismos Geneticamente Manipulados na alimentação dos animais, já que 60% da soja cultivada mundialmente é geneticamente modificada. Os OGM são proibidos em França, mas não a sua importação, nem a utilização nas criações. No próximo escândalo sanitário, os franceses ficarão a saber que alguns animais que eles devoram são há anos alimentados com OGM.
Mas além destas culturas destinadas a encher a pança dos nossos animais, agora desenvolvemos culturas destinadas a encher… os depósitos das nossas viaturas.
(...)
A DOENÇA DAS VACAS LOUCAS
A Europa e a França são há muito tempo deficitárias na produção de cereais proteaginosos, embora estas plantas ricas em proteínas permitam uma engorda rápida dos animais. Mesmo fortemente subsidiadas e cobrindo 70% da superfície agrícola, as colheitas não bastam para cobrir as necessidades das criações intensivas de gado.
De facto nós nunca tivemos meios para comer carne como comemos. Durante anos alimentámos o gado com farinhas animais saídas do açougue. E foi preciso que as vacas ficassem loucas para darmos conta de que elas se tinham tornado carnívoras. Foi preciso o escândalo do frango com dioxinas, para descobrirmos que dávamos aos frangos a comer fosse o que fosse, incluindo lamas residuais da estação de tratamento.
Estas contrariedades obrigaram os produtores a voltarem-se para o mercado de cereais, fazendo aumentar a procura. Aumentaram as importações de forragem animal, 60% das quais provêm de países em vias de desenvolvimento. Pomos as suas populações pobres a cultivar soja, milho ou colza, destinados a engordar o nosso gado. Mas a maior parte delas continua a sofrer a fome e a malnutrição.
Outro escândalo ligado a estas importações é o facto de que elas introduziram os Organismos Geneticamente Manipulados na alimentação dos animais, já que 60% da soja cultivada mundialmente é geneticamente modificada. Os OGM são proibidos em França, mas não a sua importação, nem a utilização nas criações. No próximo escândalo sanitário, os franceses ficarão a saber que alguns animais que eles devoram são há anos alimentados com OGM.
Mas além destas culturas destinadas a encher a pança dos nossos animais, agora desenvolvemos culturas destinadas a encher… os depósitos das nossas viaturas.
(...)
segunda-feira, 14 de junho de 2010
O grito
sexta-feira, 11 de junho de 2010
Hora do folhetim - 27
(...)
No princípio de Outubro, numa noite clara de luar, levantaram voo e seguiram um vale afluente do Orinoco, até ele se perder nas montanhas que separam as bacias hidrográficas do Orinoco e do Amazonas. Então desceram um pouco e sobrevoaram um afluente do Amazonas. Seguiram a estreita fita de água para sul, e tinham atingido o poderoso rio quando a manhã chegou. Deste lado do equador, os ventos alísios sopram de noroeste para sueste. Para ter vento de lado, o bando seguiu, durante a noite, a direcção de sudoeste, em vez de se dirigir directamente para sul. Voaram 800 quilómetros, e ao romper do dia tinham à vista os Andes peruanos, com os seus cumes cobertos de neve. Na orla sul da zona dos alísios o vento soprava de leste, e nas três noites seguintes dirigiram-se para sueste. Quando chegou a quinta manhã, as aves estavam de novo magras e cansadas. Poisaram nas Pampas argentinas, quatro mil quilómetros a sul dos Llanos da Venezuela.
A primavera tornara verdes o capim e os cardos gigantes, e havia enxames de gafanhotos. As aves comeram durante todo o dia, alimentando-se dos insectos nas ervas rasteiras. Por vezes procuravam zonas mais fundas, onde o chão era pantanoso e o capim crescia mais forte. Aqui viviam insectos aquáticos, que enriqueciam a alimentação, tornando-a variada. As aves prosseguiam caminho frequentemente, sem nunca fazerem longas etapas. As suas rémiges estafadas tinham caído, dando lugar a outras novas. E em breve as asas ganharam de novo a sua antiga força.
Estavam agora a quase treze mil quilómetros de distância dos locais de nidificação no Árctico. Para além delas, só os pernas-amarelas, pilritos-dos-prados e muito poucas aves tinham empreendido tão longa viagem. No entanto o impulso migratório continuava a empurrar o maçaricão e as tarambolas para sul. Nas noites claras, quando fortes ventos de oeste varriam as pampas, criando boas condições de voo com vento lateral, o bando atacava de novo os ares. Horas depois estavam duzentos, trezentos quilómetros mais a sul, e, por um momento, acalmava a sua inquietação. O maçaricão conduziu o bando até ao cimo de uma colina enluarada. As tarambolas seguiram-no e esperaram aqui pela manhã.
(...)
No princípio de Outubro, numa noite clara de luar, levantaram voo e seguiram um vale afluente do Orinoco, até ele se perder nas montanhas que separam as bacias hidrográficas do Orinoco e do Amazonas. Então desceram um pouco e sobrevoaram um afluente do Amazonas. Seguiram a estreita fita de água para sul, e tinham atingido o poderoso rio quando a manhã chegou. Deste lado do equador, os ventos alísios sopram de noroeste para sueste. Para ter vento de lado, o bando seguiu, durante a noite, a direcção de sudoeste, em vez de se dirigir directamente para sul. Voaram 800 quilómetros, e ao romper do dia tinham à vista os Andes peruanos, com os seus cumes cobertos de neve. Na orla sul da zona dos alísios o vento soprava de leste, e nas três noites seguintes dirigiram-se para sueste. Quando chegou a quinta manhã, as aves estavam de novo magras e cansadas. Poisaram nas Pampas argentinas, quatro mil quilómetros a sul dos Llanos da Venezuela.
A primavera tornara verdes o capim e os cardos gigantes, e havia enxames de gafanhotos. As aves comeram durante todo o dia, alimentando-se dos insectos nas ervas rasteiras. Por vezes procuravam zonas mais fundas, onde o chão era pantanoso e o capim crescia mais forte. Aqui viviam insectos aquáticos, que enriqueciam a alimentação, tornando-a variada. As aves prosseguiam caminho frequentemente, sem nunca fazerem longas etapas. As suas rémiges estafadas tinham caído, dando lugar a outras novas. E em breve as asas ganharam de novo a sua antiga força.
Estavam agora a quase treze mil quilómetros de distância dos locais de nidificação no Árctico. Para além delas, só os pernas-amarelas, pilritos-dos-prados e muito poucas aves tinham empreendido tão longa viagem. No entanto o impulso migratório continuava a empurrar o maçaricão e as tarambolas para sul. Nas noites claras, quando fortes ventos de oeste varriam as pampas, criando boas condições de voo com vento lateral, o bando atacava de novo os ares. Horas depois estavam duzentos, trezentos quilómetros mais a sul, e, por um momento, acalmava a sua inquietação. O maçaricão conduziu o bando até ao cimo de uma colina enluarada. As tarambolas seguiram-no e esperaram aqui pela manhã.
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quarta-feira, 9 de junho de 2010
Planeta-Mãe - 17
A MUDANÇA DOS COMPORTAMENTOS ALIMENTARES
À medida que o nível de vida aumenta, cresce o consumo de produtos de origem animal, como a carne e os lacticínios, em detrimento dos produtos vegetais. Em numerosos países emergentes, os comportamentos alimentares ocidentalizaram-se fortemente nas últimas décadas.
Por exemplo, na China, onde cerca de 300 milhões de pessoas vivem hoje segundo o nosso modo de vida, a quota de proteínas animais no consumo total de proteínas alimentares passou de 12% (1969-1971) a 39% (2001-2003). Em França, esta quota é de 65% (2001-2003).
O consumo regular de carne é visto há muito tempo como um símbolo de riqueza. E a carne é um produto de luxo. Um luxo económico. Um luxo ecológico. Em períodos difíceis, é o primeiro alimento a tornar-se raro. Torna-se um privilégio dos ricos. Foi assim nos anos 30, depois da depressão de 1929, e depois durante a 2ª Guerra Mundial. Não admira que, na euforia do pós-guerra e dos 30 anos gloriosos, o simbolismo de “comer carne todos os dias” tenha tomado tanta importância.
As criações em estábulo e as subvenções agrícolas permitiram criar a ilusão da “carne barata”. Mas se os animais tivessem sido criados em boas condições, e se a produção da sua alimentação não tivesse sido subsidiada, os preços da carne seriam bem outros. Donde vem o dinheiro das subvenções? Dos impostos!
Os camponeses que há 50 anos criavam o seu próprio gado não precisavam de conhecer os números que se seguem, para saber que comer carne todos os dias era um luxo. Vendo a quantidade de alimento que era preciso dar a um frango durante seis meses, para o ver ser comido por 4 pessoas numa refeição, eles sabiam muito bem que, para alimentar a sua família, era melhor comer pão do que engordar frangos. E tratando-se dum porco ou duma vaca…
- A carne fornecida por uma vaca representa 1.500 refeições. Os cereais que ela comeu representariam 18.000.
- 40% das colheitas alimentares mundiais destinam-se à alimentação do gado. 70% da superfície cultivada nos países desenvolvidos destina-se à alimentação animal.
- Num hectare utilizado para produzir 50 Kg de carne bovina, poderiam ser produzidas 4 toneladas de maçãs, 8 de batatas, 10 de tomate, ou 12 de aipo, etc.
- Reduzindo apenas o consumo ocidental de carne em 10%, poder-se-iam alimentar mais 100 milhões de pessoas.
- As culturas de forragens são as principais beneficiárias das pulverizações químicas.
Tinha razão Albert Einstein: “O maior progresso que a humanidade pode realizar para assegurar o seu próprio futuro consiste na adopção do regime vegetariano”.
Em França, depois dum forte aumento durante os últimos 50 anos, o consumo de carne e lacticínios por habitante continua a aumentar. No mundo, o consumo de carne passou de 27 Kg por habitante e por ano em 1990, para 38 Kg em 2005. Mesmo com população constante, esta tendência induz, só por si, a necessidade suplementar de culturas forrageiras cobrindo milhões de hectares.
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À medida que o nível de vida aumenta, cresce o consumo de produtos de origem animal, como a carne e os lacticínios, em detrimento dos produtos vegetais. Em numerosos países emergentes, os comportamentos alimentares ocidentalizaram-se fortemente nas últimas décadas.
Por exemplo, na China, onde cerca de 300 milhões de pessoas vivem hoje segundo o nosso modo de vida, a quota de proteínas animais no consumo total de proteínas alimentares passou de 12% (1969-1971) a 39% (2001-2003). Em França, esta quota é de 65% (2001-2003).
O consumo regular de carne é visto há muito tempo como um símbolo de riqueza. E a carne é um produto de luxo. Um luxo económico. Um luxo ecológico. Em períodos difíceis, é o primeiro alimento a tornar-se raro. Torna-se um privilégio dos ricos. Foi assim nos anos 30, depois da depressão de 1929, e depois durante a 2ª Guerra Mundial. Não admira que, na euforia do pós-guerra e dos 30 anos gloriosos, o simbolismo de “comer carne todos os dias” tenha tomado tanta importância.
As criações em estábulo e as subvenções agrícolas permitiram criar a ilusão da “carne barata”. Mas se os animais tivessem sido criados em boas condições, e se a produção da sua alimentação não tivesse sido subsidiada, os preços da carne seriam bem outros. Donde vem o dinheiro das subvenções? Dos impostos!
Os camponeses que há 50 anos criavam o seu próprio gado não precisavam de conhecer os números que se seguem, para saber que comer carne todos os dias era um luxo. Vendo a quantidade de alimento que era preciso dar a um frango durante seis meses, para o ver ser comido por 4 pessoas numa refeição, eles sabiam muito bem que, para alimentar a sua família, era melhor comer pão do que engordar frangos. E tratando-se dum porco ou duma vaca…
- A carne fornecida por uma vaca representa 1.500 refeições. Os cereais que ela comeu representariam 18.000.
- 40% das colheitas alimentares mundiais destinam-se à alimentação do gado. 70% da superfície cultivada nos países desenvolvidos destina-se à alimentação animal.
- Num hectare utilizado para produzir 50 Kg de carne bovina, poderiam ser produzidas 4 toneladas de maçãs, 8 de batatas, 10 de tomate, ou 12 de aipo, etc.
- Reduzindo apenas o consumo ocidental de carne em 10%, poder-se-iam alimentar mais 100 milhões de pessoas.
- As culturas de forragens são as principais beneficiárias das pulverizações químicas.
Tinha razão Albert Einstein: “O maior progresso que a humanidade pode realizar para assegurar o seu próprio futuro consiste na adopção do regime vegetariano”.
Em França, depois dum forte aumento durante os últimos 50 anos, o consumo de carne e lacticínios por habitante continua a aumentar. No mundo, o consumo de carne passou de 27 Kg por habitante e por ano em 1990, para 38 Kg em 2005. Mesmo com população constante, esta tendência induz, só por si, a necessidade suplementar de culturas forrageiras cobrindo milhões de hectares.
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terça-feira, 1 de junho de 2010
Hora do folhetim - 26
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7
As tarambolas-douradas e o maçaricão-esquimó ficaram duas semanas no Orinoco e depressa voltaram a engordar. Milhares de outras narcejas povoavam a vasta pradaria, tarambolas que também tinham feito a longa viagem sobre o oceano, e ainda uma dúzia de outras espécies que tinham voado sobre terra, através das planícies da América do Norte e do istmo do Panamá. Aqui encontravam-se de novo, nos Llanos da Venezuela. Também havia esplêndidas aves dos trópicos, que nidificavam nesta altura e alimentavam zelosamente os filhos. Os ninhos das garças-brancas cobriam largas superfícies dos pântanos, junto ao rio, e as garças eram tantas que se empurravam umas às outras. A íbis vermelha, jóia das aves tropicais, voava em bandos ao longo das margens do rio, procurando alimento. De início, quando as íbis se aproximavam, pareciam sombras cinzentas; ao passarem perto, inflamava-se-lhes a plumagem vermelha; quando se afastavam, a cor desvanecia-se novamente.
Havia comida em abundância e muitas das narcejas árcticas deixavam-se ficar por aqui. Mas o maçaricão e as tarambolas, após duas semanas em que comeram e acumularam gordura, voltaram a sentir o velho impulso que as empurrava para sul. As outras tarambolas já tinham partido. Tal como no Lavrador, o bando do maçaricão foi o último a largar.
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7
As tarambolas-douradas e o maçaricão-esquimó ficaram duas semanas no Orinoco e depressa voltaram a engordar. Milhares de outras narcejas povoavam a vasta pradaria, tarambolas que também tinham feito a longa viagem sobre o oceano, e ainda uma dúzia de outras espécies que tinham voado sobre terra, através das planícies da América do Norte e do istmo do Panamá. Aqui encontravam-se de novo, nos Llanos da Venezuela. Também havia esplêndidas aves dos trópicos, que nidificavam nesta altura e alimentavam zelosamente os filhos. Os ninhos das garças-brancas cobriam largas superfícies dos pântanos, junto ao rio, e as garças eram tantas que se empurravam umas às outras. A íbis vermelha, jóia das aves tropicais, voava em bandos ao longo das margens do rio, procurando alimento. De início, quando as íbis se aproximavam, pareciam sombras cinzentas; ao passarem perto, inflamava-se-lhes a plumagem vermelha; quando se afastavam, a cor desvanecia-se novamente.
Havia comida em abundância e muitas das narcejas árcticas deixavam-se ficar por aqui. Mas o maçaricão e as tarambolas, após duas semanas em que comeram e acumularam gordura, voltaram a sentir o velho impulso que as empurrava para sul. As outras tarambolas já tinham partido. Tal como no Lavrador, o bando do maçaricão foi o último a largar.
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Um mundo feito à mão-15
Planeta-Mãe - 16
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ÊXODO RURAL MUNDIAL
Em França, o êxodo rural tornou-se uma tendência de fundo no início dos anos 50. Esta revolução social, inerente à construção duma sociedade industrial decidida com o plano Marshall de 1948, levou milhões de franceses a deixar as suas terras e a procurar as cidades industriais.
Este êxodo constituiu uma verdadeira subversão nos fundamentos da nossa sociedade e seus modos de vida. Em 1937 mais de 50% da população francesa vivia ainda no campo. A agricultura era então, de longe, a principal actividade do país. A maioria da população vivia no campo, não se contentando em habitá-lo. A maior parte dos habitantes, mesmo se não eram agricultores de profissão, cultivavam pelo menos uma horta. Satisfazer por si mesmo as necessidades alimentares era então uma actividade prioritária para numerosas famílias.
Nos dias de hoje, a actividade agrícola não ocupa mais do que 3% da população francesa, e é desta parte incrivelmente restrita de trabalhadores que depende a satisfação das necessidades alimentares de toda a população. Esta situação não tem precedentes na história da Humanidade. Nunca o número de pessoas que abdicaram da responsabilidade da sua sobrevivência alimentar foi tão grande, e o número de pessoas encarregadas de assumir essa responsabilidade foi tão pequeno.
Do mesmo modo, o imperialismo económico dos países ocidentais sobre aqueles “em vias de desenvolvimento” provoca a mesma revolução à escala planetária. Todos os anos milhões de pessoas abandonam a sua terra, para encher as filas da miséria urbana nos mega-bidonvilles das novas mega-cidades.
Desde 2007, pela primeira vez na história da humanidade, mais de metade da população mundial vive em cidades.
Diminui cada vez mais o número de pessoas que satisfazem por si mesmo as suas necessidades alimentares. E o êxodo rural contribui assim para o aumento da procura alimentar nos mercados mundiais. Esta tendência para o êxodo deverá prosseguir, até atingir 75% de citadinos.
Nos países em que este êxodo não se faz para bidonvilles, mas para o “melhor” do modelo social ocidental, o impacto sobre o mercado alimentar é ainda mais marcante. Com efeito, o regime alimentar destas populações muda ao mesmo tempo que o seu modo de vida.
ÊXODO RURAL MUNDIAL
Em França, o êxodo rural tornou-se uma tendência de fundo no início dos anos 50. Esta revolução social, inerente à construção duma sociedade industrial decidida com o plano Marshall de 1948, levou milhões de franceses a deixar as suas terras e a procurar as cidades industriais.
Este êxodo constituiu uma verdadeira subversão nos fundamentos da nossa sociedade e seus modos de vida. Em 1937 mais de 50% da população francesa vivia ainda no campo. A agricultura era então, de longe, a principal actividade do país. A maioria da população vivia no campo, não se contentando em habitá-lo. A maior parte dos habitantes, mesmo se não eram agricultores de profissão, cultivavam pelo menos uma horta. Satisfazer por si mesmo as necessidades alimentares era então uma actividade prioritária para numerosas famílias.
Nos dias de hoje, a actividade agrícola não ocupa mais do que 3% da população francesa, e é desta parte incrivelmente restrita de trabalhadores que depende a satisfação das necessidades alimentares de toda a população. Esta situação não tem precedentes na história da Humanidade. Nunca o número de pessoas que abdicaram da responsabilidade da sua sobrevivência alimentar foi tão grande, e o número de pessoas encarregadas de assumir essa responsabilidade foi tão pequeno.
Do mesmo modo, o imperialismo económico dos países ocidentais sobre aqueles “em vias de desenvolvimento” provoca a mesma revolução à escala planetária. Todos os anos milhões de pessoas abandonam a sua terra, para encher as filas da miséria urbana nos mega-bidonvilles das novas mega-cidades.
Desde 2007, pela primeira vez na história da humanidade, mais de metade da população mundial vive em cidades.
Diminui cada vez mais o número de pessoas que satisfazem por si mesmo as suas necessidades alimentares. E o êxodo rural contribui assim para o aumento da procura alimentar nos mercados mundiais. Esta tendência para o êxodo deverá prosseguir, até atingir 75% de citadinos.
Nos países em que este êxodo não se faz para bidonvilles, mas para o “melhor” do modelo social ocidental, o impacto sobre o mercado alimentar é ainda mais marcante. Com efeito, o regime alimentar destas populações muda ao mesmo tempo que o seu modo de vida.
sexta-feira, 21 de maio de 2010
Hora do folhetim - 25
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O maçaricão sabia que, por detrás da faixa de costa com praias e estuários de rios, havia mangais pantanosos. Eles estendiam-se ao longo de 250 quilómetros, e poisar neste emaranhado era tão difícil como fazê-lo no mar alto. Assim, quando clareasse, teriam que continuar a voar em frente, até atingirem os Llanos relvados da Venezuela. As asas tinham-se tornado pesadas, mas o maçaricão ganhava altura para poder ultrapassar os montes costeiros. Era um tormento. Atravessaram os montes e o cansaço mantinha-se, crescia de repente em guinadas agudas, e fazia vibrar cada fibra dos seus pequenos corpos.
A noite estava escura como bréu. Até que a manhã rompeu finalmente, não com amarelos e vermelhos, mas com uma luz turva e cinzenta. Por baixo deles a terra era húmida e lamacenta, atravessada por rios largos, como a tundra na primavera. Tão longe quanto podiam ver, na luz cinzenta da manhã, estendia-se em todas as direcções o extenso vale do Orinoco. E continuava a chover.
O bando tinha voado quase sessenta horas seguidas, sem descanso nem alimento. Das terras da neve e da luz árctica, chegavam agora a um lugar que ressumava da exuberante vegetação dos trópicos. Diante deles havia centenas de quilómetros de terras pantanosas e de planícies cobertas de capim. Era um formigueiro de insectos, alimento mais que suficiente, que só os meses de chuvas contínuas dos trópicos podiam produzir.
O dia ficara um pouco mais claro, com uma luz matinal fosca. O maçaricão abriu as asas rígidas e mergulhou quase em picada. Deixara para trás a vastidão dum continente, desde a última vez que as suas asas tinham estado inactivas. As tarambolas seguiram-no e o bando poisou.
Nenhuma ave descansou, pois antes de mais era preciso comer. Durante cinquenta e cinco horas tiveram os estômagos vazios, tinham voado quase cinco mil quilómetros e consumiram toda a gordura que tinham acumulado no Lavrador. Dela não restava agora um único grama. Em menos de três dias, as aves tinham perdido entre 10 a 15 por cento do seu peso. Só o facto de elas serem os mais económicos consumidores de energia de todo o reino animal lhes possibilitava tal voo. Para atravessar o oceano, cada ave tinha queimado sessenta gramas de gordura. Com tal consumo de energia, um avião de meia tonelada voaria 250 quilómetros com cinco litros de combustível, em lugar dos habituais trinta e cinco.
Só descansaram depois de terem comido. Nas vastas savanas do Orinoco havia grande abundância de alimento. Assim, antes de cair a noite tropical, as aves comeram ainda uma segunda vez, durante várias horas.
O CORREDOR DA MORTE
Este é o oitavo boletim do Museu Nacional dos Estados Unidos, sobre a vida das aves norteamericanas, por Arthur Cleveland Bent.
Ordem: Limicolae. Família: Scolopacidae... Numenius borealis, maçaricão-esquimó... Não há dúvida de que foram sobretudo os abates excessivos, durante as viagens migratórias e durante o inverno na América do Sul, os responsáveis pela sua extinção. Não acredito que esta espécie tenha sido apanhada no alto mar por uma monstruosa catástrofe, que a tenha dizimado. O maçaricão possuía asas poderosas, e podia escapar a grandes tempestades, ou podia evitá-las. Além disso a sua época de migração era tão prolongada que uma só tempestade não poderia exterminar toda a espécie. Nada aponta para doenças, ou para a redução do seu alimento habitual. Há uma causa única, ele foi aniquilado pelos homens: no verão e no outono, no Lavrador e na Nova Inglaterra; no inverno, na América do Sul; e, pior que tudo, na primavera, desde o Texas até ao Canadá. Eles eram tão mansos e confiantes, tão apegados aos seus companheiros de viagem, que foram abatidos em massa, vítimas fáceis da carnificina. Estas delicadas aves deixavam atrás de si, por todo o lado, um verdadeiro corredor da morte. E ninguém mexeu um só dedo para as defender, até ser demasiado tarde...
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O maçaricão sabia que, por detrás da faixa de costa com praias e estuários de rios, havia mangais pantanosos. Eles estendiam-se ao longo de 250 quilómetros, e poisar neste emaranhado era tão difícil como fazê-lo no mar alto. Assim, quando clareasse, teriam que continuar a voar em frente, até atingirem os Llanos relvados da Venezuela. As asas tinham-se tornado pesadas, mas o maçaricão ganhava altura para poder ultrapassar os montes costeiros. Era um tormento. Atravessaram os montes e o cansaço mantinha-se, crescia de repente em guinadas agudas, e fazia vibrar cada fibra dos seus pequenos corpos.
A noite estava escura como bréu. Até que a manhã rompeu finalmente, não com amarelos e vermelhos, mas com uma luz turva e cinzenta. Por baixo deles a terra era húmida e lamacenta, atravessada por rios largos, como a tundra na primavera. Tão longe quanto podiam ver, na luz cinzenta da manhã, estendia-se em todas as direcções o extenso vale do Orinoco. E continuava a chover.
O bando tinha voado quase sessenta horas seguidas, sem descanso nem alimento. Das terras da neve e da luz árctica, chegavam agora a um lugar que ressumava da exuberante vegetação dos trópicos. Diante deles havia centenas de quilómetros de terras pantanosas e de planícies cobertas de capim. Era um formigueiro de insectos, alimento mais que suficiente, que só os meses de chuvas contínuas dos trópicos podiam produzir.
O dia ficara um pouco mais claro, com uma luz matinal fosca. O maçaricão abriu as asas rígidas e mergulhou quase em picada. Deixara para trás a vastidão dum continente, desde a última vez que as suas asas tinham estado inactivas. As tarambolas seguiram-no e o bando poisou.
Nenhuma ave descansou, pois antes de mais era preciso comer. Durante cinquenta e cinco horas tiveram os estômagos vazios, tinham voado quase cinco mil quilómetros e consumiram toda a gordura que tinham acumulado no Lavrador. Dela não restava agora um único grama. Em menos de três dias, as aves tinham perdido entre 10 a 15 por cento do seu peso. Só o facto de elas serem os mais económicos consumidores de energia de todo o reino animal lhes possibilitava tal voo. Para atravessar o oceano, cada ave tinha queimado sessenta gramas de gordura. Com tal consumo de energia, um avião de meia tonelada voaria 250 quilómetros com cinco litros de combustível, em lugar dos habituais trinta e cinco.
Só descansaram depois de terem comido. Nas vastas savanas do Orinoco havia grande abundância de alimento. Assim, antes de cair a noite tropical, as aves comeram ainda uma segunda vez, durante várias horas.
O CORREDOR DA MORTE
Este é o oitavo boletim do Museu Nacional dos Estados Unidos, sobre a vida das aves norteamericanas, por Arthur Cleveland Bent.
Ordem: Limicolae. Família: Scolopacidae... Numenius borealis, maçaricão-esquimó... Não há dúvida de que foram sobretudo os abates excessivos, durante as viagens migratórias e durante o inverno na América do Sul, os responsáveis pela sua extinção. Não acredito que esta espécie tenha sido apanhada no alto mar por uma monstruosa catástrofe, que a tenha dizimado. O maçaricão possuía asas poderosas, e podia escapar a grandes tempestades, ou podia evitá-las. Além disso a sua época de migração era tão prolongada que uma só tempestade não poderia exterminar toda a espécie. Nada aponta para doenças, ou para a redução do seu alimento habitual. Há uma causa única, ele foi aniquilado pelos homens: no verão e no outono, no Lavrador e na Nova Inglaterra; no inverno, na América do Sul; e, pior que tudo, na primavera, desde o Texas até ao Canadá. Eles eram tão mansos e confiantes, tão apegados aos seus companheiros de viagem, que foram abatidos em massa, vítimas fáceis da carnificina. Estas delicadas aves deixavam atrás de si, por todo o lado, um verdadeiro corredor da morte. E ninguém mexeu um só dedo para as defender, até ser demasiado tarde...
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Planeta-Mãe - 15
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PONTOS COMUNS
Não é exaustiva a lista que explica as causas da baixa de produção alimentar no mundo. Elas têm um ponto comum: parecem todas condenadas a acentuar-se.
A predominância dum pensamento único, que transforma o nosso modo de vida ocidental em sinónimo de sucesso aos olhos das massas, não deixa entrever mudanças de tendência. Ao mesmo tempo que qualquer veleidade de verdadeira mudança é travada pelos poderosos lóbis industriais.
Pelas mesmas razões, os factores que explicam o aumento da procura de produtos agrícolas nos mercados mundiais sofrem as mesmas influências e oferecem perspectivas similares…
PORQUE AUMENTA A PROCURA DE PRODUTOS AGRÍCOLAS?
“Somos muito numerosos!” É o que se ouve muitas vezes da boca de ocidentais que colocam esta questão. A realidade dos factos contradiz esta ideia. Mais do que o aumento da população mundial, há factores que alimentam a alta dos preços de maneira bem mais significativa.
- O êxodo rural mundial
- As mudanças do comportamento alimentar
- A doença das vacas loucas
- Os agro-combustíveis
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PONTOS COMUNS
Não é exaustiva a lista que explica as causas da baixa de produção alimentar no mundo. Elas têm um ponto comum: parecem todas condenadas a acentuar-se.
A predominância dum pensamento único, que transforma o nosso modo de vida ocidental em sinónimo de sucesso aos olhos das massas, não deixa entrever mudanças de tendência. Ao mesmo tempo que qualquer veleidade de verdadeira mudança é travada pelos poderosos lóbis industriais.
Pelas mesmas razões, os factores que explicam o aumento da procura de produtos agrícolas nos mercados mundiais sofrem as mesmas influências e oferecem perspectivas similares…
PORQUE AUMENTA A PROCURA DE PRODUTOS AGRÍCOLAS?
“Somos muito numerosos!” É o que se ouve muitas vezes da boca de ocidentais que colocam esta questão. A realidade dos factos contradiz esta ideia. Mais do que o aumento da população mundial, há factores que alimentam a alta dos preços de maneira bem mais significativa.
- O êxodo rural mundial
- As mudanças do comportamento alimentar
- A doença das vacas loucas
- Os agro-combustíveis
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sexta-feira, 14 de maio de 2010
Hora do folhetim - 24
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Ele sabia que havia ilhas além, a oeste, por baixo das espessas nuvens do horizonte. Ficavam apenas a uma ou duas horas de voo. Porém, para as alcançar era preciso seguir um rumo em que o vento soprava directamente de cauda. E isso prejudicava o voo, tanto como o vento de frente. Por isso o maçaricão mantinha a rota inicial. Ele sabia que havia de passar uma terceira noite antes que chegassem à costa. E se alcançassem terra na escuridão, numa noite cerrada e cheia de nuvens, só poderiam poisar quando os contornos dos pantanosos mangais venezuelanos e das ilhas de areia dos estuários se desenhassem na claridade da manhã.
O dia demorou muito a passar. Mas finalmente o sol mergulhou no mar das Caraíbas, e rapidamente ficou escuro, quase sem crepúsculo. As nuvens cresceram e ocultaram a lua e as estrelas. Caíram as primeiras gotas, o bando chegava aos trópicos em pleno tempo das chuvas. Era uma chuva ligeira e fina, que refrescava o ar e facilitava a respiração. E assinalava a proximidade da costa.
Voaram duas horas à chuva. O maçaricão não podia ver nada, mas reconheceu imediatamente quando deixaram o mar e se acharam sobre terra firme. Primeiro trovejou, no escuro, a rebentação, e logo a seguir surgiram as turbulências das correntes térmicas, que se elevavam do solo quente.
As aves não podiam senão continuar em frente, hora após hora. E agora, sabendo que por baixo delas se estendia terra firme, o voo tornou-se uma prova de força cruel, e cada batida de asa uma luta atormentada contra a inércia e o esgotamento. Muita energia era agora desperdiçada, uma vez que as rémiges estavam de tal modo estafadas que já não cortavam o ar como pás duma hélice. Tal como o faziam ao princípio, ao deixarem o Lavrador, com batidas ligeiras e fáceis.
(...)
Ele sabia que havia ilhas além, a oeste, por baixo das espessas nuvens do horizonte. Ficavam apenas a uma ou duas horas de voo. Porém, para as alcançar era preciso seguir um rumo em que o vento soprava directamente de cauda. E isso prejudicava o voo, tanto como o vento de frente. Por isso o maçaricão mantinha a rota inicial. Ele sabia que havia de passar uma terceira noite antes que chegassem à costa. E se alcançassem terra na escuridão, numa noite cerrada e cheia de nuvens, só poderiam poisar quando os contornos dos pantanosos mangais venezuelanos e das ilhas de areia dos estuários se desenhassem na claridade da manhã.
O dia demorou muito a passar. Mas finalmente o sol mergulhou no mar das Caraíbas, e rapidamente ficou escuro, quase sem crepúsculo. As nuvens cresceram e ocultaram a lua e as estrelas. Caíram as primeiras gotas, o bando chegava aos trópicos em pleno tempo das chuvas. Era uma chuva ligeira e fina, que refrescava o ar e facilitava a respiração. E assinalava a proximidade da costa.
Voaram duas horas à chuva. O maçaricão não podia ver nada, mas reconheceu imediatamente quando deixaram o mar e se acharam sobre terra firme. Primeiro trovejou, no escuro, a rebentação, e logo a seguir surgiram as turbulências das correntes térmicas, que se elevavam do solo quente.
As aves não podiam senão continuar em frente, hora após hora. E agora, sabendo que por baixo delas se estendia terra firme, o voo tornou-se uma prova de força cruel, e cada batida de asa uma luta atormentada contra a inércia e o esgotamento. Muita energia era agora desperdiçada, uma vez que as rémiges estavam de tal modo estafadas que já não cortavam o ar como pás duma hélice. Tal como o faziam ao princípio, ao deixarem o Lavrador, com batidas ligeiras e fáceis.
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